O sonho de ser professor tem sido sufocado pela realidade
do mercado nas universidades brasileiras. As políticas de valorização dos
docentes não avançam. As empresas, por sua vez, disputam especialistas com
salários estimulantes e boas condições de trabalho. Quem entra no ensino
superior acalentando o plano de dar aulas, acaba desistindo. Em números
absolutos, os que mais abandonam o caminho do magistério são os candidatos a
professor de português ou matemática. Só em 2011, foram quase 40 mil
desistências, segundo dados do último Censo do Ensino Superior. O curso de
física é o que tem o maior percentual de alunos desvinculados em comparação com
o número de matrículas: 31%.
Todas as disciplinas citadas são obrigatórias nos
currículos das escolas brasileiras. Mesmo assim, o desempenho dos estudantes
nessas cadeiras deixa muito a desejar, segundo pesquisas oficiais de avaliação,
como a Prova Brasil. Especialistas ouvidos pelo Estado de Minas acreditam que,
para mudar esse quadro, são necessárias políticas capazes de aliar a educação
ao crescimento do país.
O alto índice de desistência, segundo a diretora-executiva
do Movimento Todos pela Educação, Priscila Cruz, pode, por outro lado, mostrar
que existem mais estudantes que optam pelo bacharelado em vez do curso de licenciatura.
Na opinião dela, o principal chamariz para a mudança é a possibilidade de o
profissional conseguir um emprego mais bem remunerado. “No caso das ciências
exatas, por exemplo, como há poucos profissionais na área e uma demanda maior
por profissionais como engenheiros e matemáticos, eles acabam trocando de ramo.
Em uma economia aquecida, de pleno emprego, muitas empresas absorvem esses
profissionais”, avalia. Quem perde é a educação.
A trajetória de Leandro Chiarini, de 20 anos, estudante do
5º semestre de matemática, reflete essa tese. Ele iniciou a graduação com a
intenção de fazer dupla habilitação (bacharelado e licenciatura), mas, ao longo
do curso, descobriu que o campo da matemática era bem mais amplo. “São opções
diferentes. É bom ensinar, mas vi que gosto mais de aprender”, destaca. “A
quantidade de coisas para fazer na área é grande e há espaço para quem quer
seguir a carreira na pesquisa”, completa. Apesar de considerar a área
fascinante, ele destaca que é fácil perceber que muita gente desiste com
facilidade do curso. “Quando entrei na universidade éramos uns 40 calouros. No
segundo semestre, só oito permaneceram”, lamenta.
Na física, também é fácil topar com histórias como a de
Leandro. O estudante do 9º semestre do curso de física Diego Veloso, de 24, nem
chegou a cogitar a licenciatura. “Optei pelo bacharelado para poder me dedicar
com exclusividade à pesquisa. A área ainda não é muito financiada, mas tem
avançado bastante”, argumenta. Diego, porém, aponta a falta de estímulo para o
exercício da docência como o principal motivo de desistência da licenciatura.
“Os profissionais da educação básica não são valorizados, principalmente na
rede pública”, ressalta.
Pesquisa O retrato do desestímulo para seguir carreira no
magistério também aparece em uma pesquisa feita em 2010 pela Universidade de
São Paulo (USP) dentro da instituição, a maior do país. O estudo apontou que
dar aulas é apenas a quarta razão para escolha da licenciatura.
O presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas
Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Luiz Claudio, assegura que o Ministério da
Educação tem acompanhado o problema, mas destaca que o quadro está mudando.
Segundo ele, a criação do Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à
Docência (Pibid) tem dados bons resultados, assim como o Exame Nacional do
Ensino Médio e o fortalecimento do programa de assistência estudantil. “O Pibid
tem feito com que o estudante se motive, fique no curso. E, com o Enem, a
concorrência para os cursos de formação de professor aumentou e tem atraído
estudantes com notas mais altas, que permanecem no curso”. As mudanças, segundo
ele, devem se refletir nos próximos censos do ensino superior.
A política do piso nacional para os professores e as ações
do Plano Nacional de Educação, que tramita no Senado Federal, também são
apontados pelo órgão como políticas eficientes.
Rede pública
não consegue formar quadros
A carência de professores se reflete diretamente na má
formação dos estudantes. Recentemente, um relatório sobre as metas da educação,
divulgado pelo Movimento Todos pela Educação, mostrou que apenas três em cada
10 alunos terminam o ensino médio com conhecimentos de língua portuguesa
adequados à série. Em matemática, a situação é bem pior: só um em 10. “Alagoas
e Maranhão, por exemplo, fizeram concurso para professor e não conseguiram
contratar nenhum no estado inteiro. Isso ajuda a explicar porque os resultados
dos estudantes são ruins. Há um déficit de profissionais no Norte e no Norte,
principalmente”, pontua a diretora executiva da ONG, Priscila Cruz.
Outro problema apontado pela diretora do movimento é o
ciclo vicioso gerado pela má formação dos estudantes e pela falta de atração da
carreira. Alunos mal formados desistem da carreira e, sem professores de
qualidade, as escolas seguem formando mal seus estudantes. “O professor de
escola pública ganha 40% menos que um profissional com o mesmo nível de
escolaridade. Quando o aluno se dá conta disso, ele escolhe outra carreira, e
não a docência. Com poucos professores, há casos de estados que reduzem as
exigências para conseguir contratar”, afirma.
Fonte: Estado de Minas (MG)
Nenhum comentário:
Postar um comentário