domingo, 13 de janeiro de 2013

Um aluno entre a escola pública e a particular


Da Brasilândia à Vila Mariana. Ou mais especificamente da escola estadual Plínio Negrão, na zona norte, ao Colégio Bandeirantes, na zona sul de SP. Trecho de cerca de 20 quilômetros, que passou a ser percorrido diariamente por Victor Alexandre de Paula, 18, estudante do 3.º ano do ensino médio, assim que o jovem deixou a antiga escola pública para estudar no colégio de ponta. Para Victor, cursar uma instituição privada como bolsista não se limita a um novo trajeto ou a uma grade curricular mais “puxada”, mas a maneira como os estudantes precisam enxergar as diferenças sociais para se adaptar a “um mundo diferente”.
O ingresso do jovem ao Colégio Bandeirantes aconteceu por meio do Instituto Social Para Motivar, Apoiar e Reconhecer Talento (Ismart), uma iniciativa sem fins lucrativos que há 13 anos descobre e apoia jovens com perfil acadêmico de baixa renda para estudarem em colégios privados de elite. O jovem é um entre os mais de 700 bolsistas apoiados, apenas no ano passado, pelo programa, que atua em seis cidades brasileiras em parceria com instituições como o Objetivo, Santo Américo, Etapa, Móbile e outros, em São Paulo; e São Bento e Santo Inácio, no Rio de Janeiro.
Apenas em 2011, 94% dos bolsistas que concluíram o ensino médio foram aprovados em processos seletivos em cursos superiores, sendo que 70% deles passaram para as instituições de ensino federais e estaduais, como Victor, que recebeu hoje a notícia da aprovação para a segunda fase do vestibular da Fuvest para economia.
De acordo com Maria Amélia Sallum, diretora do Ismart, o projeto tem o propósito de dar aos jovens uma formação capaz de não servir apenas para que sejam aprovados nos principais vestibulares do País, mas que também possa dar novas referências de vida a eles. “A ideia é dar acesso a outras coisas, para que possam fazer outras escolhas e, consequentemente, possam dar uma vida melhor à família”, afirma.
Para dar conta dessa missão, o instituto abarca dois programas. O primeiro é o Alicerce, no qual Victor foi aprovado, destinado a alunos do 7º ano (antiga 6ª série). Nele, os estudantes selecionados fazem jornada dupla, ou seja, estudam normalmente meio período na escola pública onde já estão matriculados e, no contraturno, realizam um curso preparatório de dois anos em uma das escolas particulares parceiras do projeto. Depois desse período de preparação e de conclusão do ensino fundamental, os bolsistas passam a estudar apenas nas instituições de ensino particulares parceiras. “Os alunos permanecem nas escolas durante todo o ensino médio, recebem apoio psicológico, familiar e acompanhamento da equipe do instituto. Todo o benefício é concedido sem nenhum custo para as famílias”, afirma Maria Amélia.
Já o segundo programa, o Bolsa Talento, é voltado para alunos do 9º ano, e diferentemente do Alicerce, os estudantes não precisam passar pelos dois anos de jornada dupla entre escola pública e privada. “Os alunos entram diretamente como bolsistas na instituição privada parceria, o que faz com que eles tenham muita dedicação e vontade para superar qualquer possível defasagem escolar”, diz a diretora.
“Depois que deixei a minha antiga escola e passei a estudar no Band [Colégio Bandeirantes], nesses três últimos anos, não sabia como os alunos reagiriam, se fariam alarde ou não. Sempre deixei claro que eu era aluno bolsista. Não fizeram. Pelo contrário, gostavam de saber como era a escola pública”, afirma Victor, que sempre morou na Brasilândia e neste ano recebeu o prêmio de estudante destaque no Colégio Bandeirantes.
Victor é filho único de mãe piauiense que trabalha como encarregada em uma fábrica, que não conseguiu concluir o ensino médio, e de pai funcionário público, que está prestes a concluir o curso de letras na USP. Segundo ele, estudar no colégio privado não trouxe apenas mais chances de batalhar por uma vaga no ensino superior, mas o ajudou, principalmente, a ampliar sua visão de mundo, antes ainda carregada de muitos estereótipos. “Estudar no Band me fez ficar mais tolerante e perceber as disparidades do mundo entre os que têm mais dinheiro e os que têm menos. Aprendi a conhecer melhor as pessoas antes de julgá-las. Percebi que os dramas, que antes eu achava muito fúteis como o fato de o pai ter cancelado a carteirinha do clube da menina da escola, era algo comum para ela, que teve e tem uma vida diferente da minha”, diz.
No fim do mês passado, Victor foi convidado para palestrar no TEDxColégioBandeirantes, onde contou experiências de sua vida quando estudava em seu bairro. “A escola onde estudava não era maravilhosa, mas também não era ruim. Um dos principais problemas era a infraestrutura. Lembro de um momento marcante durante a época em que estudei lá: estava com o portão fechado, em reunião, por conta de uma reforma. Na frente dela havia um canteiro de obras e algumas pessoas começaram a jogar pedras em direção à escola. Uma acertou em cheio a minha cabeça”, afirma.
Fonte: Portal Porvir
 

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