“O ambiente Escolar
me dá fobia, taquicardia, ânsia de vômito. Até os enfeites das paredes me dão
nervoso. E eu era a pessoa que mais gostava de enfeitar a Escola. Cheguei a um
ponto que não conseguia ajudar nem a minha filha ou ficar sozinha com ela. Eu
não conseguia me sentir responsável por nenhuma criança. E eu sempre tive muita
paciência, mas me esgotei.”
Sem infraestrutura: Em 72,5% das Escolas da rede pública
não há biblioteca.
O relato é da Professora Luciana Damasceno Gonçalves, de
39 anos. Pedagoga, especialista em psicopedagogia há 15 anos, Luciana é um
exemplo entre milhares de Professores que, todos os dias e há anos, se afastam
das salas de aula e desistem da profissão por terem adoecido em suas rotinas.
Para o pesquisador Danilo Ferreira de Camargo, o
adoecimento desses profissionais mostra o quanto o cotidiano de Professores e
Alunos nos colégios é “insuportável”. “Eles revelam, mesmo que de forma oblíqua
e trágica, o contraste entre as abstrações de nossas utopias pedagógicas e a
prática muitas vezes intolerável do cotidiano Escolar”, afirma.
O tema foi estudado pelo historiador por quatro anos,
durante mestrado na Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP).
Na dissertação O abolicionismo Escolar: reflexões a partir do adoecimento e da
deserção dos Professores, Camargo analisou mais de 60 trabalhos acadêmicos que
tratavam do adoecimento de Professores.
Camargo percebeu que a “epidemia” de doenças ocupacionais
dos Docentes foi estudada sempre sob o ponto de vista médico. “Tentei mapear o
problema do adoecimento e da deserção dos Professores não pela via da
vitimização, mas pela forma como esses problemas estão ligados à forma
naturalizada e invariável da forma Escolar na modernidade”, diz.
Desistência: Salários baixos provocam fuga de Professores
da carreira
Luciana começou a adoecer em 2007 e está há dois anos afastada. Espera não ser colocada de volta em um colégio. “Tenho um laudo dizendo que eu não conseguiria mais trabalhar em Escola. Eu não sei o que vão fazer comigo. Mas, como essa não é uma doença visível, sou discriminada”, conta. A Professora critica a falta de apoio para os Docentes nas Escolas.
Luciana começou a adoecer em 2007 e está há dois anos afastada. Espera não ser colocada de volta em um colégio. “Tenho um laudo dizendo que eu não conseguiria mais trabalhar em Escola. Eu não sei o que vão fazer comigo. Mas, como essa não é uma doença visível, sou discriminada”, conta. A Professora critica a falta de apoio para os Docentes nas Escolas.
“Me sentia remando contra a maré. Eu gostava do que fazia,
era boa profissional, mas não conseguia mudar o que estava errado. A Escola
ficou ultrapassada, não atrai os Alunos. Eles só estão lá por obrigação e os
pais delegam todas as responsabilidades de educar os filhos à Escola. Tudo isso
me angustiava muito”, diz.
Viver sem
Escola: é possível?
Orientado pelo Professor Julio Roberto Groppa Aquino, com
base nas análises de Michel Foucault sobre as instituições disciplinares e os
jogos de poder e resistência, Camargo questiona a existência das Escolas como
instituição inabalável. A discussão proposta por ele trata de um novo olhar
sobre a Educação, um conceito chamado abolicionismo Escolar.
“Criticamos quase tudo na Escola (Alunos, Professores,
conteúdos, gestores, políticos) e, ao mesmo tempo, desejamos mais Escolas, mais
Professores, mais Alunos, mais conteúdos e disciplinas. Nenhuma reforma
modificou a rotina do cotidiano Escolar: todos os dias, uma legião de crianças
é confinada por algumas (ou muitas) horas em salas de aula sob a supervisão de
um Professor para que possam ocupar o tempo e aprender alguma coisa, pouco
importa a variação moral dos conteúdos e das estratégias didático-metodológicas
de Ensino”, pondera.
Ele ressalta que essa “não é mais uma agenda política para trazer salvação
definitiva” aos problemas Escolares. É uma crítica às inúmeras tentativas de
reformular a Escola, mantendo-a da mesma forma. “A minha questão é outra: será
possível não mais tentar resolver os problemas da Escola, mas compreender a
existência da Escola como um grave problema político?”, provoca.
Na opinião do pesquisador, “as mazelas da Escola são
rentáveis e parecem se proliferar na mesma medida em que proliferam
diagnósticos e prognósticos para uma possível cura”.
Problemas
partilhados
Suzimeri Almeida da Silva, 44 anos, se tornou Professora
de Ciências e Biologia em 1990. Em 2011, no entanto, chegou ao seu limite.
Hoje, conseguiu ser realocada em um laboratório de ciências. “Se eu for
obrigada a voltar para uma sala de aula, não vou dar conta. Não tenho mais
estrutura psiquiátrica para isso”, conta a carioca.
Ela concorda que a estrutura Escolar adoece os
profissionais. Além das doenças físicas – ela desenvolveu rinite alérgica por
causa do giz e inúmeros calos nas cordas vocais –, Suzimeri diz que o ambiente
provoca doenças psicológicas. Ela, que cuida de uma depressão, também reclama
da falta de apoio das famílias e dos gestores aos Professores.
“O Professor é culpado de tudo, não é valorizado. Muitas
crianças chegam cheias de problemas emocionais, sociais. Você vê tudo errado,
quer ajudar, mas não consegue. Eu pensava: eu não sou psicóloga, não sou
assistente social. O que eu estou fazendo aqui?”, lamenta.
Fonte: iG
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