Crianças de diferentes idades dividem a mesma sala de
aula, orientadas por Professores com conhecimentos multidisciplinares. As
paredes sumiram, assim como as carteiras enfileiradas e os quadros-negros. Cada
Aluno escolhe a tarefa que deseja realizar, sozinho ou em grupo. Inspirado em
colégios experimentais de Europa, Estados Unidos e América Latina, o Ginásio
Experimental de Novas Tecnologias Educacionais (Gente) estreou há duas semanas
na Escola municipal André Urani, na Rocinha, que atende Alunos do sétimo ao
nono ano do Ensino fundamental.
O projeto, pioneiro em Escolas públicas no país, suscita
discussões sobre a adaptação dos Alunos e dos pais, sobre a divisão de modelos
nos colégios municipais e sobre a própria readequação dos estudantes ao Ensino
tradicional.
Modelo será
expandido
Idealizador do Gente, que será oficialmente lançado hoje,
o subsecretário municipal de Novas Tecnologias Educacionais, Rafael Parente,
acredita que a Escola tradicional, em que os Alunos são divididos por séries e
precisam absorver o conteúdo de forma igual, está ultrapassada. Com o projeto,
ele pretende desenvolver um modelo focado na individualidade de cada criança. O
investimento foi alto: R$ 3,5 milhões - R$ 2,5 milhões vieram de empresas
parceiras - para o treinamento de Professores, desenvolvimento dos programas
educacionais e equipamentos. A Escola André Urani funciona como um piloto, que
deve ser expandido nos próximos anos. O objetivo é levar o Gente a 150 colégios
do Rio até 2016, sob o custo médio de R$ 600 mil por unidade.
Do pátio, os inspetores se espantam com a calmaria que
tomou conta do lugar. Divididos entre duas amplas salas de aula e uma sala de
leitura, os 180 Alunos, reunidos em grupos de seis, entretêm-se com exercícios,
vídeos e jogos educativos apresentados em netbooks - cada um tem o seu. A
Escola conta ainda com laboratório de ciências, quadra poliesportiva, piscina e
refeitório. As apostilas e os cadernos não foram deixados de lado, mas a
tecnologia é a grande aliada do modelo educacional, que prevê metas semanais de
aprendizagem focadas nas necessidades de cada Aluno.
- É como se fosse um mundo da fantasia - resume Micael, de
17 anos. - A gente nem sente o tempo passar.
O Rio conta com algumas Escolas experimentais privadas, como
o Centro Educacional Anísio Teixeira (Ceat), a Escola Parque e a Escola Sá
Pereira. A inovação do Gente, portanto, é a introdução desse modelo no Ensino
público brasileiro.
Especialista em Educação e Ensino, a linguista Eloíza Dias
Neves, da Universidade Federal Fluminense (UFF), lembra que nem todo estudante
está preparado para uma Escola experimental. A Educadora lembra que o modelo
propõe uma nova forma de aquisição do conhecimento, mas a eficácia irá depender
do contexto em que os estudantes estão.
- Meu questionamento é como será essa experiência numa
Escola pública dentro de uma comunidade. O pai da Escola pública geralmente se
envolve menos com a Educação dos filhos, passa muito tempo fora de casa. Muitos
Alunos sequer têm os pais presentes - diz a Educadora, lembrando de suas
próprias experiências em instituições do estado.
Método ainda
gera dúvidas
A relação com os pais dos Alunos do Gente é um assunto
delicado. Todos assinaram um documento em que afirmam estarem cientes do modelo
de Escola em que inseriram seus filhos, além de terem participado de uma
reunião expositiva. Mas os Professores afirmam que muitos pais sequer sabem
ler. Outros acham a Escola bonita, bem equipada, mas parecem não ter
compreendido todas as inovações.
A artesã Angélica Telles, tia de um dos Alunos da Escola,
surpreendeu-se ao ser questionada sobre o novo modelo educacional:
- Nunca tinha ouvido falar sobre algo do tipo. Acho
estranho, mas quem tem que saber se é bom ou não são os Alunos e os
Professores.
O sobrinho, Ângelo, tem outros questionamentos. Aluno do
nono ano, ele deverá voltar para uma Escola tradicional:
- Perguntei ao Professor: a gente vai ter que voltar para
a realidade dos quadros? Essa é a única Escola a que tenho vontade de ir. Ele
disse que vou voltar, mas com outra cabeça.
Fonte: O Globo (RJ)
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