As escolas hoje se encontram num impasse. Se por um lado
as tecnologias estão cada vez mais diversas e de fácil acesso, por outro os
professores ainda encontram problemas na hora de utilizá-las dentro da sala de
aula. Seja pela falta de conhecimento, pela escassez de equipamentos ou por
outros problemas, a utilização de computadores, notebooks e tablets na sala de
aula ainda pode melhorar, e muito, no Brasil.
Para Cida Narloch, assessora pedagógica do sistema
educacional Família e Escola, o primeiro passo para os professores poderem
fazer um bom uso das tecnologias na educação básica é o planejamento: preparar
a aula, a ferramenta e o conteúdo. Com uma aula estruturada, o educador sentirá
muito mais facilidade para lidar com os computadores e tablets dentro do
ambiente escolar. Além disso, Cida, que foi uma das palestrantes da VI Maratona
do Ensino Infantil realizada pelo Sindicato das Escolas Particulares do Paraná
(Sinepe/PR), defende também que é preciso desmistificar a tecnologia para o
professor, afirmando que o educador não está na sala de aula para ensinar
informática e sim para utilizá-la para ensinar a sua matéria.
Gestão
Educacional: Quais são as vantagens que as
tecnologias trazem, principalmente para o processo de alfabetização das
crianças?
Cida Narloch: O professor tem em mãos uma ferramenta poderosa de
tecnologia educacional, que é o computador. Mas o computador, por si só, não
trabalha. Ele precisa de produto, de software, de programas, de sites da
internet.Se o professor busca isso, filtrando e contextualizando esse conteúdo
dentro de um planejamento, o enriquecimento, o resultado que ele tem na aula é
maravilhoso, porque ele está trabalhando com uma ferramenta que encanta a
criança. A aula vai se tornar mais lúdica e mais atrativa, mas existe ainda a
necessidade do planejamento do professor.
Gestão
Educacional: O professor está preparado para
lidar com as tecnologias na sala de aula? E caso não esteja, como prepará-lo?
Cida Narloch: Nós não podemos generalizar que todo professor não está
preparado, porque alguns professores se enquadram como imigrantes digitais, mas
outros já tiveram uma longa caminhada em relação ao uso das tecnologias. Para
os que não são nativos digitais, existem cursos de formação em Tecnologia
Educacional, sites e portais. Primeiramente, tem que desmistificar o
computador. O professor tem que ver o computador como uma ferramenta
pedagógica, algo que vai auxiliar no planejamento dele e no qual ele pode
trabalhar o conteúdo. Então, quando recebe a formação, o professor vai
experimentar todas essas situações de aprendizagem e vai conseguir visualizar o
aluno explorando essa ferramenta.
Gestão
Educacional: Como o professor pode trabalhar a
questão do diálogo com a criança chamada de nativa digital para que não haja
problemas de comunicação?
Cida Narloch: Na realidade, a comunicação do professor com o aluno –
imigrante e nativo digital, respectivamente –, não compreende uma linguagem
específica. O educador tem uma linguagem própria de professor, que é a
linguagem pedagógica. É essa mesma linguagem que ele vai utilizar no
laboratório, porque ele não vai dar aula de informática. Ele só utiliza o
computador como recurso. Ele não vai ensinar recursos tecnológicos e
nomenclaturas difíceis. O professor vai trabalhar no laboratório de informática
o mesmo conteúdo que trabalha em sala de aula, tanto que é importante que o
laboratório seja, na verdade, uma sala de aula informatizada e não um ambiente
cheio de máquinas em que a criança entra só para brincar. Ou seja, se esse
professor se preparar, ele vai perceber que a linguagem é a mesma: ele vai
falar sobre os mesmos eixos de trabalho que planejou para trabalhar o ano todo
com o aluno. Ele só vai escolher qual momento trabalhar isso. Por exemplo, ele
vai pegar um programa lá no computador que fala sobre animais, porque está na
sala de aula falando sobre os animais. Então o professor vai procurar um
programa ou um site que também fale disso, para que o laboratório seja uma
extensão da sala de aula.
Gestão
Educacional: A internet é considerada um ambiente
virtual bastante dispersivo. Quando se fala de crianças, que se distraem
facilmente, fica pior ainda. Como evitar a dispersão que a internet pode causar
na escola?
Cida Narloch: A criança, para trabalhar, precisa ter foco. E esse foco
quem dá é o professor. Antes de o educador levar o aluno para o laboratório,
antes de pedir para o estudante acessar um site, essa página tem que já estar
filtrada dentro do planejamento do professor. Aí o professor vai direcionar. E
para o aluno, é importante que ele registre, faça anotações. Se o professor
solicitar um registro do aluno mediante aquela situação de aprendizagem que
está sendo explorada naquele momento, o aluno não vai sair daquele foco porque
ele tem uma tarefa a cumprir. Vamos supor que o professor está trabalhando no
mês de maio, o Dia das Mães, e vai pedir para o aluno fazer um cartão. O
professor, portanto, já tem que dizer para a criança qual é o site com os
modelos de cartões, e o aluno vai entrar naquele site. Se ele tem uma tarefa a
cumprir naquele site, não há necessidade de sair abrindo outros. O professor
tem que ter esse direcionamento, tem que intermediar o tempo todo. Se o educador
deixar livre, o aluno vai acessar tudo e nada ao mesmo tempo.
Gestão
Educacional: Como o professor deve escolher as
atividades e jogos que serão utilizados? Como deve ser o processo de raciocínio
dele nessa seleção?
Cida Narloch: O professor tem o planejamento, que é exigido pela escola,
e tem todas as suas aulas planejadas. Então ele precisa saber que recursos
tecnológicos a escola oferece. Com isso, o educador insere esses recursos
tecnológicos no planejamento. Portanto, ele não vai buscar um recurso que a
tecnologia oferece. O professor deve inserir o conteúdo dentro dessa
tecnologia. Muitas vezes, ele vê a tecnologia como o computador, só que a
tecnologia não se resume só a isso. Se o professor fizer um levantamento com os
seus alunos sobre o que eles têm de tecnologia dentro de casa, ele vai
descobrir muitas [outras] tecnologias. O aluno vai citar que ele tem em casa o
computador, o fax, a máquina calculadora, o celular... E dentro da escola ele
vai citar que tem o computador, o netbook, o iPod e por aí afora. É uma
imensidão de recursos tecnológicos. O professor tem que focar esse recurso
tecnológico dentro do seu planejamento. Ele só precisa adequar.
Gestão
Educacional: Na sua opinião, as tecnologias irão
substituir o material didático tradicional, como livro, caderno, lápis e
caneta, ou elas funcionarão mais como um suporte para o professor?
Cida Narloch: Jamais a tecnologia vai substituir o material didático.
Ao contrário: ela vai precisar muito mais destes recursos porque a tecnologia,
por si só, não faz nada. O que eu tenho? Vamos supor, eu tenho um hardware, um
computador, um notebook, um tablet. O que eu tenho lá dentro [do hardware]?
Recursos que vêm de algum lugar, que têm que sair de algum lugar. Ele vai
precisar do autor, do professor, de todo esse volume de atividade para colocar
lá dentro. Então como que eu vou extrair esse conteúdo se ele não vem de algum
lugar? Ele tem que ter uma fonte, por isso ele não vai substituir o livro. Pelo
contrário, [esse conteúdo] vai precisar muito mais dos livros. Nós não podemos
ignorar toda uma história da educação. Há quanto tempo existe o giz? Ele ainda
está lá na escola. Ele ainda é importante. Nós já temos nas salas de aula de
muitas escolas a lousa digital, mas a lousa digital não dispensou a lousa tradicional.
A caneta ótica não dispensou o giz, ele continua lá, ele continua sendo
importante. Eu acredito que tem lugar para tudo e para todos dentro da
educação.
Gestão
Educacional: Seguindo nesta linha, como aliar
então a letra cursiva, que alguns estudiosos acreditam ser algo antiquado, com
o uso das tecnologias?
Cida Narloch: Como eu disse antes, nós não podemos ignorar a nossa
história. Inicialmente, nós aprendemos a escrever, não a digitar. Eu aprendi a
ler, eu fui alfabetizada, eu aprendi a escrever, isso tudo numa sequência. A
criança começa com a letra em caixa alta. Depois, aprende a letra cursiva. Hoje
tem uma fala no mercado que diz que a letra que encontramos na mídia é a letra
de máquina, mas a criança precisa da letra cursiva porque, com ela, o professor
trabalha a coordenação motora fina da criança. Ela vai exigir um pouquinho mais
da criança, que precisa ter este recurso e desenvolver isso. Portanto, eu vejo
que a letra cursiva ainda é importante, embora a criança tenha as letras todas
nas teclas. Mas eu penso que o homem existiu antes da máquina e aprendeu a
escrever antes da máquina. A máquina hoje é importante por agilizar o processo,
mas eu não dispenso a letra cursiva.
Fonte: Revista Gestão Educacional
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