Cleusa Bueno de Freitas, de 63 anos, fala com orgulho dos
29 em que trabalha no Colégio Estadual Homero Batista de Barros, no bairro
Capão Raso. A inspetora, que começou como auxiliar de limpeza e morou 14 anos
no local como caseira, está perto de se aposentar, mas o que seria aguardado
com ansiedade por muitos traz à “Tia Cleusa” outro tipo de sentimento. “Eu amo
essa Escola. É difícil me afastar.”
O apego pelos Alunos e o afeto declarado pela instituição
de Ensino parecem ser comuns entre os inspetores Escolares.
No século 19, os inspetores eram figuras mais poderosas do
que muitos Professores e diretores. O que parece não fazer o menor sentido hoje
é constatado pela pesquisa de Etienne Baldez Louzada Barbosa, doutoranda em
Educação pela UFPR. Sua dissertação de mestrado tratou da inspetoria Escolar no
Paraná de duzentos anos atrás, quando esses profissionais trabalhavam
diretamente para os governantes da província, e fiscalizavam as práticas tanto
de Alunos como de Docentes. “Eles inspecionavam os livros e métodos usados, se
os Alunos estavam bem vestidos e se havia ordem na Escola”, conta.
Embora eles raramente sejam citados nos grandes debates
sobre Educação, poucos profissionais se fazem presentes de modo tão constante
na vida dos Alunos.
A estudante de Geografia Josilaine Alberton é neta de
Ernestino Gomes, falecido em 2002, e que foi inspetor no mesmo Colégio Homero
Batista por 31 anos. Ela guarda na memória várias histórias que o tornaram uma
lenda na Escola. “Meu avô colocava graxa em cima do muro para que os Alunos não
fugissem”, conta.
Embora os discursos pedagógicos atuais optem por não
enfatizar o aspecto disciplinador da função, situações que exigem uma chamada
de atenção continuam a fazer parte da inspetoria. “Normalmente os meninos
brigam por causa de menina, por ciúmes”, conta Marcos Antônio Augusto, que já
trabalhou em várias unidades da rede Bom Jesus e hoje comanda uma equipe de 27 inspetores
na unidade Nossa Senhora de Lourdes.
Embora a função fiscalizadora seja inevitável, alguns
profissionais conquistam a colaboração dos estudantes colocando-se na função de
conselheiros. É o caso de Solange Aureliano Gonçalves, inspetora do Colégio
Decisivo há 23 anos. Ela conta que muitos Alunos a procuram para contar
confidências e, mesmo depois que deixam a Escola, lembram-se das conversas que
mantinham nos intervalos.
Papel semelhante já foi desempenhado por Jefferson
Vinícius Pinheiro, responsável pela inspetoria no Colégio Acesso e cupido nas
horas vagas. “Eu me lembro de um Aluno que estava interessado numa menina, mas
não tinha coragem de pedir o telefone. Eu pedi, entreguei para ele e agora os
dois são noivos”, conta Pinheiro, emocionado. Mesmo sendo alvo de vários
apelidos criados pelos Alunos por sua falta de cabelo – Dalai-Lama e
Pouca-Telha são alguns deles – ele não hesita ao responder se gosta do
trabalho. “Não me imagino longe dos Alunos.”
Enfoque disciplinador da função é evitado
Pode não fazer diferença para os estudantes, mas algumas
instituições optaram por deixar para trás o estereótipo de “general” criado em
torno do cargo de inspetor, mudando, inclusive, o nome da função. No Colégio
Medianeira, por exemplo, teoricamente não há inspetores, mas sim um Serviço de
Orientação e Convivência Escolar. Nos colégios Marista há monitores, e até
mesmo a rede municipal extinguiu o cargo, criando no lugar a função de auxiliar
de serviços Escolares.
“Nós trabalhamos a autonomia dos Alunos, não pretendemos
vigiá-los”, conta Olindo Carlos Baggio, do Medianeira. Ele faz parte da equipe
de orientação do colégio, um grupo de Professores e funcionários que se revezam
para estar presentes no recreio dos Alunos. O próprio Baggio é Professor de
Química do Ensino médio.
Há 19 anos trabalhando no Colégio Marista Paranaense, o
supervisor de apoio educacional Sílvio Duda é o chefe dos monitores e
acompanhou a mudança no modo de ver a função de inspetoria. “Não é mais aquela
coisa de só olhar o que o estudante faz de errado, o monitor está ali para
ajudar os Alunos”, diz. Para os pais que o procuram, no entanto, saber sobre o
comportamento dos filhos no intervalo das aulas continua a ser interesse
frequente.
Fonte: Gazeta do Povo (PR)
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