“Não gosto. Isso é
muito difícil!”, afirma Thaylla Emília de Oliveira Ferreira, aluna do 9° ano
do Colégio Estadual Cultura e Cooperativismo, em Goiânia, justificando seu
desinteresse pela Matemática. A estudante, que acabara de ser expulsa da aula,
sabe que vai precisar da disciplina futuramente, mas, por agora, não se
preocupa com isso.
Ela é só uma entre os milhares de estudantes brasileiros
que não gostam e que apresentam dificuldades no aprendizado da matéria,
considerada uma vilã por uma grande maioria de alunos.
Um relatório elaborado pelo Movimento Todos pela Educação
comparou o rendimento dos alunos do 5° ano do Ensino Fundamental ao das turmas
do 3° ano do Ensino Médio. E os resultados foram claros: as escolas brasileiras
não estão conseguindo ensinar Matemática.
De acordo com o estudo, quase 90% dos estudantes
brasileiros que concluem o Ensino Médio saem da escola sem saber noções básicas
da disciplina como operações de álgebra, leitura de gráficos, mapas e tabelas,
probabilidade e porcentagem, entre outros.
Mas o prejuízo dos alunos não é apenas acadêmico. “A
Matemática te dá ferramentas de pensamento lógico, racional, de análise crítica
e recursos para enfrentar problemas e buscar novas soluções. O que preocupa não
é que os alunos não tenham o conhecimento da disciplina, mas que eles não
tenham nada desse pensamento matemático associado a ela, que é o que nos
capacita para fazer muita coisa socialmente”, defende a coordenadora do grupo
Mathema de formação e pesquisa, Kátia Stocco Smole.
Embora o Ensino Médio tenha apresentado o pior resultado,
as dificuldades começam no Fundamental, garante Alejandra Meraz Velasco,
gerente da área técnica do Todos pela Educação.
Para ela, o problema da aprendizagem em Matemática
perpassa toda a Educação Básica e está centrado na carência de professores
especialistas e na formação desses docentes.
Cadê o
professor?
Como a Matemática assusta os alunos desde o Ensino
Fundamental, é na outra ponta, na universidade, que o prejuízo se revela. A
procura pelo curso é pequena e dos que entram, poucos conseguem se formar como
professor, pois a evasão é grande e muitos preferem seguir o bacharelado em
outras áreas, como na Engenharia e Informática.
“Não é nem pelo salário, mas pelas condições de trabalho.
São salas cheias e aluno agredindo o professor. O profissional se sente
ameaçado”, argumenta o diretor do Departamento de Matemática, Física, Química
e Engenharia de Alimentos da PUC-GO, Antônio Newton Borges.
O resultado mais gritante dessa realidade é a deficiência
de profissionais nas escolas. “Temos falta de docentes licenciados em
Matemática e aí a secretaria depende, muitas vezes, de um contrato temporário
de um professor sem formação completa e que ainda está na graduação,” reconhece
a gerente de apoio do Ensino Fundamental da Secretaria Estadual de Educação de
Goiás (Seduc), Viviane Pereira da Silva Melo.
No interior do estado a situação é pior, admite o
superintendente do Ensino Médio da Seduc, Fernando Pereira dos Santos. “Se tem
um contador na cidade disposto a dar aula de Matemática, nós contratamos. Às
vezes, contratamos um professor para dar aula de Química, Física e Matemática
tudo junto, porque não tem docente especializado.”
Contudo, segundo Viviane, a secretaria já detectou esses
problemas e está implantando dois projetos que visam o reforço na disciplina e
na correção de fluxo, mas a solução para o problema ainda não foi encontrado.
Formação
conservadora
Se entrar na licenciatura já é difícil, permanecer nela é
tarefa para poucos. A falta de valorização profissional faz com que alunos de
nível mais baixo procurem a licenciatura, o que cria dificuldades durante o
curso e também interfere no desempenho dos futuros docentes, explica José Pedro
Machado, professor de Didáticas em Matemática na UFG.
Para evitar a evasão, a universidade criou uma disciplina
para interligar os conhecimentos adquiridos no Ensino Médio ao Superior. Ainda
assim, ele vê falhas na formação oferecida. “O professor está saindo para o
mercado sem levar em consideração o contexto sociocultural dos aluno e a
disciplina acaba por não fazer sentido para a realidade deles.”
Para José Pedro, o desinteresse dos alunos é explicado por
essa má formação, já que os professores não tem didática suficiente para
estimulá-los e para trabalhar diferentes conteúdos, além do livro didático,
como as novas tecnologias. “São métodos e técnicas obsoletas”, critica ele.
Desinteresse
dos pais
Enquanto os especialistas centram as críticas na academia,
os professores que estão em sala de aula acreditam que o desinteresse e,
consequentemente, o baixo rendimento dos alunos em Matemática tem outro vilão:
os pais.
Ana Paula Mendes, que leciona a disciplina no Colégio
Estadual Cultura e Cooperativismo e também do Colégio Shalon, vê com clareza a
diferença do acompanhamento familiar que é feito na rede pública e privada.
Segundo ela, nas instituições de ensino particulares, os
pais cobram resultados dos filhos e da escola e o rendimento, obviamente, é
melhor nelas. “Na estadual, os pais nem sabem se tem tarefa de casa ou não.
Eles não acompanham e, mesmo que a coordenação corra atrás deles, nós não
podemos fazer nada no sentido de aplicar uma advertência ou reprovar”,
desabafa.
Além disso, Ana Paula acredita que o sistema de avaliações
da rede pública desestimula os estudantes. “Os alunos que vem do município já
estão acostumados a apenas passar de Ciclos, estando aptos ou não. Eles chegam
aqui sem saber nada: não somam, não subtraem, não multiplicam nem dividem. Mas
ele não precisa fazer nada para tirar nota, porque nós não podemos reprovar.”
Mas a Matemática não é vilã para todo mundo. Nunca foi
problema, por exemplo, para Bárbara Guimarães, estudante do 9° ano do Cultura e
Cooperativismo. “Eu sempre me saí melhor nessa disciplina, mas não sei porquê,”
brinca.
A dedicada aluna, que adora resolver um desafio, não sabe
ainda qual será seu futuro profissional, mas já tem uma certeza: não será a
carreira de Exatas. Mas Bárbara entende bem que, sem a Matemática, ela não irá
muito longe profissionalmente.
Fonte: Tribuna do Planalto (GO)
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