Ficou pronto
na sexta-feira um novo estudo do Banco Mundial, com o título Economic Mobility
and the Rise of the Latin American Middle Class (em português, Mobilidade
econômica e a ascensão da classe média). O calhamaço de 200 páginas pode ser
comprado on-line pelo site da instituição por US$ 25,95. O Brasil não está na
lista dos países contemplados por um desconto de 20% na venda da publicação,
afinal, como constata o próprio estudo, não se enquadra no perfil de um país de
baixa renda.
O crescimento
da classe média aqui está longe de ser uma novidade. Mas o estudo traz muitas
informações relevantes sobre esse tema, ainda não esgotado. Em primeiro lugar,
coloca as coisas em perspectiva. Os brasileiros tendem a olhar para o próprio
umbigo sem perceber que fazemos parte de um contexto maior — comportamento que
corretamente criticamos nos norte-americanos, sem, contudo, fazermos
autocrítica.
O fato é que a
classe média não cresceu só no Brasil, mas também nos nossos vizinhos. Em 2003
era composta por 103 milhões de pessoas em toda a região. Em 2009, passou a
incluir 152 milhões, um crescimento de 48%. Hoje, 30% dos latino-americanos
estão nesse estrato social e econômico.
A Organização
para a Cooperação e o Desenvolvimento Econômico (OCDE) usa outros critérios de
renda e vê 275 milhões de pessoas na classe média da região, o que equivale a
metade da população. No Brasil, a Fundação Getulio Vargas chegou a resultado
semelhante, apontando 53% dos brasileiros no que chamamos de classe C.
Mudança de classe
Mais
importante do que quantificar essa camada social, o estudo do Banco Mundial
mostra que 43% dos latino americanos mudaram de classe entre meados dos anos
1990 e o final da década passada. E ainda mais relevante é mostrar o quanto
essa evolução foi desigual. As pessoas que passaram mais tempo Escola foram as
principais beneficiadas por aumento de renda na América Latina.
O problema é
que a presença na sala de aula não depende de fatores aleatórios. Há, estatisticamente,
uma forte correlação positiva entre lacunas de Ensino dos pais e dos filhos. Em
um ciclo vicioso dos mais perversos, os problemas de aprendizado se
transformaram aqui em doença hereditária.
São frequentes
os exageros quanto às expectativas do que a Educação pode fazer para melhorar a
trajetória das pessoas e o desempenho econômico dos países em que vivem.
Demonstração disso é que a Europa, onde está talvez a maior parte das boas
Escolas do planeta, segue em queda indefinida, sem descobrir o fundo do poço. É
bom lembrar que não existe apenas um tipo de Ensino. São muitas as formas
diferentes de informar e de aperfeiçoar talentos, ou então de miná-los por
treino equivocado.
Sociedades com
baixíssimo nível educacional como a nossa, porém, são as que têm mais a ganhar
com o aumento da Escolaridade dos cidadãos, qualquer que seja o método de
Ensino. A presença das crianças na Escola tem crescido — graças, entre outros
fatores, à condicionalidade estabelecida por programas de transferência de
renda. Mas não basta sentar as crianças diante de um Docente. É preciso que
elas realmente aprendam.
Como melhorar
O debate sobre
qualidade na Educação inclui muitos riscos, sobretudo o de embarcarmos na
conversa dos vendedores de ilusões. Principalmente, os de equipamentos. Eles
alardeiam a certeza de que não pode existir Escola com giz e quadro negro no
século 21. Pode sim. Diante das carências da maior parte das Escolas do país,
há muito o que melhorar independentemente da tecnologia. É claro que é o ideal
é fazer tudo juntamente: melhorar a saúde dos Alunos, os edifícios das Escolas,
os esquipamentos e os profissionais de Ensino. O que não se pode é achar que o
computador vai proporcionar a maior parte desse ganho.
Grande parte
da qualidade da Educação depende da formação do Professor e de seu estímulo
para fazer um bom trabalho. Mas até nesse ponto há risco de embarcar em falsas
ideais. A falácia corporativa nesse caso sugere que aumento de salário irá
resultar em ganho proporcional de qualidade no Ensino. Não é assim. Embora a
remuneração seja um poderoso instrumento de incentivo, qualquer pessoa que
tenha conhecimento razoável em recursos humanos sabe que isso não funciona se
for concedido indiscriminadamente. Ganhos salariais devem ser associados a
metas de desempenho e de capacitação profissional. O bônus deve ser maior para
os Professores que fazem pós-graduação, os que não faltam e os que conseguem
fazer os Alunos aprenderem.
Há uma falácia
que abarca as duas anteriores. É a do aumento das despesas com Educação em
relação ao Produto Interno Bruto (PIB, simplificadamente o que se produz em um
ano) do Brasil. Discute-se, no Congresso Nacional, a meta de elevar o atual
patamar de 5% para 10%.
O país precisa
mesmo é de metas de aumento de qualidade na Educação, o que exige, aliás,
sofisticação bem maior do que o exercício aritmético sugerido no aumento das
despesas em relação ao PIB. Talvez o país consiga chegar lá. Algo que atrapalha
muito é que as lacunas de formação dos brasileiros prejudicam o próprio debate
que tentam empreender sobre a Educação. E os tornam mais vulneráveis aos
vendedores de ilusões. Eles sim, em geral, muito bem educados.
Fonte: Correio Braziliense (DF)
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