Apesar de
ostentar o sexto maior Produto Interno Bruto, o Brasil não pode ser considerado
país desenvolvido: seus resultados francamente insatisfatórios em Educação
barram a entrada no clube. Em plena economia do conhecimento e no olho do
furacão dos mercados globais, a Educação é mais do que nunca componente crucial
de qualquer estratégia de desenvolvimento. O envelhecimento populacional é
fonte de pressão suplementar por exigir uma população cada vez mais produtiva
para sustentar a parcela inativa.
A despeito de
deficiências do sistema educacional, a atenção governamental mantém-se
inabalável com gastos em Educação como proporção do produto praticamente
constantes desde 1990. Não há pressa, não há urgência. Aguardando a revolução
pela inércia, nossa distância em relação aos desenvolvidos só abisma.
Recentemente,
foi aprovado o texto do Plano Nacional de Educação (projeto de lei 8.035/10),
no qual se destacam metas como: eliminação do Analfabetismo, universalização da
Educação básica e extensão da cobertura de Creches e Ensino superior, além de
estipular o patamar de 10% do PIB para a Educação, até 2020.
Infelizmente,
o Plano não ensejou um debate substantivo sobre estratégias alternativas: as
reações se dirigiram à demonstração de sua impossibilidade. As teses resumem-se
à afirmação de que o Brasil não gasta pouco em Educação, mas gasta mal, e de
que gasto e qualidade não estão relacionados. A conclusão é: alocação adequada
em combinação com gestão apropriada resolveriam os problemas. Reagimos:
O país gasta
muito em Educação? Há dois critérios: a comparação com outros países e a
estimativa de nossas necessidades. Em ambos, fica evidente que a Educação aqui
é subfinanciada.
Alguns
desconsideram o volume de recursos, insistindo que nossa prioridade e nosso
sacrifício pessoal são comparáveis: tanto como percentual do PIB, quanto como
fração do PIB per capita, gastamos valores compatíveis com os níveis da OCDE.
Porém, na comparação dos gastos reais, o Brasil não ocupa posição de destaque:
cada Aluno brasileiro recebe investimento anual de R$ 4 mil, equivalentes a
pouco mais de US$ 2 mil com paridade de poder de compra, bem abaixo da média da
OCDE (US$ 8.600).
Outra questão
é o déficit em termos de capital: em média, o Brasil gasta relativamente pouco
com capital, 5,4% do total de gastos, contra 7,5% na Finlândia, 14,6% na
Coreia, e 8,7% em média na OCDE. Quantas Creches precisamos? Como expandir a
minúscula jornada Escolar sem mais Escolas? E universidades para receber os
jovens que queremos incluir? Mesmo os que gastam mais, como Chile e México, não
equacionaram esses problemas; e os desenvolvidos não possuem déficit de capital
significativo.
A
universalização da cobertura, mesmo que limitada à Educação básica, requer mais
recursos. O novo Plano vai além: quer-se garantir acesso, permanência e
qualidade. Tanto o acesso, por meio da expansão de capacidade e dos gastos em
custeio, quanto a permanência, pela elevação da atratividade da Escola parecem
igualmente requerer injeção de recursos.
Mas aumento de
gasto significa aumento de qualidade? Afirmar que a relação não é automática
não significa afirmar que seja inexistente. Quanto maior o gasto, menor o
impacto de um gasto adicional. Importante trabalho conduzido pelo especialista
em Educação Eric Hanushek confirma que, para o Brasil, o aumento dos gastos em
Educação, com o Fundef, levou à melhora do aprendizado. Como gastamos pouco, o
impacto de gastos adicionais ainda é grande.
Desviar
recursos do Ensino superior público salda a dívida? Os gastos brasileiros de
US$ 11.700 por Aluno no Ensino superior se situam abaixo da média de US$ 13.700
na OCDE (em paridade de poder de compra, e desconsiderando a inclusão de gastos
com hospitais universitários). Se por mágica se acabasse com a universidade pública,
os recursos economizados não seriam suficientes para tapar os buracos da
Educação básica: ainda que se aplicasse todo o 1% do PIB gasto pelo setor
público com Ensino superior nos níveis inferiores, as deficiências e
subcoberturas persistiriam.
Esperar o
bônus demográfico reduzir a demanda? Segundo alguns, a redução relativa e
absoluta de crianças e adolescentes se encarregaria de reduzir a demanda por
Educação básica, tornando desnecessário comprometer porção maior do PIB para
elevar o gasto por Aluno. Tal argumento ignora o atual déficit educacional. E
mais: enquanto o bônus demográfico não chega, vamos condenar uma geração à
indigência cognitiva? Em 2030, se os gastos forem excessivos, que se legisle
novamente.
E a carga
tributária? A literatura e o bom-senso associam o apoio à percepção de sua
legitimidade. Se a Educação melhora em consequência de seu aumento, a
legitimidade e o apoio a uma carga mais alta tendem a ser maiores. Além do
mais, a carga precisará aumentar apenas se os gastos financeiros do governo -
que dependem de fatores macroeconômicos e têm efeitos perniciosos - se
mantiverem rígidos.
Custo ou
investimento? Gastos em Educação são investimentos sociais com retorno
econômico calculável e efeitos multiplicadores sobre renda e produto. Segundo o
Ipea, para cada real gasto em Educação, o PIB aumentaria em R$ 1,85 e a renda
das famílias, em R$ 1,70.
Nos parece
ingênuo acreditar que seja possível melhorar a ainda deficiente Educação
brasileira somente através do aprimoramento da gestão de Escolas e secretarias
de Educação, ou de uma simplória proposta de realocação de recursos entre
níveis de Educação, ou ainda através de uma resignada "paciência
demográfica". O PNE é um passo correto neste sentido.
Fonte: O Globo (RJ)
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