sábado, 23 de março de 2013

'Educação de qualidade se faz em rede', diz educador

Dados divulgados na quarta-feira pela ONG Todos Pela Educação mostram que o Brasil ainda está longe de garantir educação de qualidade a todos os seus estudantes. Segundo o levantamento, relativo a 2011, a cada cem alunos da rede pública, apenas 12 aprenderam o esperado ao fim do ensino fundamental. Para ajudar a reverter essa situação, o educador João Batista Araujo e Oliveira, presidente do Instituto Alfa e Beto, criou o prêmio Prefeito Nota 10, que vai identificar e recompensar o município que conseguir assegurar que a maioria de seus estudantes esteja de fato aprendendo. "Quero ajudar na conscientização de que todas as escolas precisam oferecer a mesma qualidade, não importa se estão na periferia ou no centro da cidade. Todos os alunos precisam aprender", diz. O prêmio, no valor de 200.000 reais, só será concedido a partir de 2014, quando poderão ser computados os resultados da Prova Brasil 2013. Mas uma série de reportagens publicadas pelo site de VEJA nesta semana mostrou a cidade que sairia vencedora caso a premiação fosse realizada neste ano: Novo Horizonte, no interior de São Paulo. "O que mais me chamou atenção foi o comprometimento desse município com a equidade", observa Oliveira. Na entrevista a seguir, o educador fala sobre a iniciativa e os desafios do Brasil na área da educação.
De onde surgiu a ideia do prêmio Prefeito Nota 10? Sempre que são divulgados os índices educacionais, como Ideb e Enem, as atenções se voltam para a melhor escola do país ou da cidade. As pessoas não entenderam ainda que a função do governo não é colocar de pé uma escola excelente. Ele precisa colocar a rede toda para funcionar. Caso contrário, as famílias ficam sujeitas ao acaso na hora de matricular seus filhos: se os pais tiverem sorte, conseguem vaga na escola-modelo. Se não, terão de se contentar com as outras escolas ruins da cidade.
Para vencer o prêmio, o município precisa oferecer educação de qualidade para o maior número de alunos. Sim. Quero ajudar na conscientização de que todas as escolas precisam oferecer a mesma qualidade, não importa se estão na periferia ou no centro da cidade. Todos os alunos precisam aprender, sem exceção. Educação se faz em rede – eis uma lição que ainda precisa ser aprendida.
Por que o prêmio será destinado exclusivamente às redes municipais de educação? O ensino fundamental precisa ter um dono, e esse dono deve ser o município. Hoje, cerca de 70% das escolas de 1º a 5º ano já estão na mão das cidades, mas apenas a metade das de 6º a 9º ano são municipais. O estado ainda tem uma participação alta, o que considero nocivo. Por isso, o prêmio vai incentivar o que chamamos de municipalização da educação fundamental. De qualquer forma, o governador do estado do município vencedor receberá uma menção honrosa.
Por que a municipalização é importante? É mais fácil estabelecer um padrão de qualidade quando a rede tem um único dono. É preferível que esse dono seja o município, porque o cidadão está mais próximo da prefeitura do que do estado. Ele precisa saber de quem cobrar quando não encontra educação de qualidade. Além disso, está na Constituição que as cidades são responsáveis por essa etapa da educação.
A pedido de VEJA.com, a organização do prêmio analisou os dados da Prova Brasil 2011 para identificar quem seria o vencedor do prêmio, caso ele fosse concedido agora. Nenhuma cidade atingiu o patamar exigido: Novo Horizonte foi apenas o município que mais se aproximou da marca. Isso o surpreendeu? Esse resultado, apesar de terrível do ponto de vista da educação, não chega a surpreender. Por isso, desde o começo, deixamos claro no regulamento que, caso nenhum município atinja as metas propostas, será premiado aquele que mais se aproximar delas. É interessante observar também que nos anos iniciais do ensino fundamental (1º a 5º ano) os resultados chegam bem perto do satisfatório, mas nos anos finais (6º a 9º ano) eles ainda estão muito distantes do ideal.
Novo Horizonte (SP) é uma cidade de pouco mais de 37.000 habitantes, com apenas cinco escolas na rede municipal. É mais fácil garantir qualidade em circunstâncias como essas? Não há nenhuma pesquisa que prove, empiricamente, que é mais fácil garantir equidade em redes pequenas. O senso comum pode até nos dizer que sim, mas se fosse tão fácil assim administrar bem redes pequenas toda cidade de porte semelhante ao de Novo Horizonte teria educação de qualidade. E sabemos muito bem que não é isso que acontece. E, se pensarmos bem, redes maiores têm mais recursos financeiros e humanos, o que em teoria facilita a gestão. Então, o fato desse município ser pequeno não tira seu mérito.
Outro fato chama a atenção em Novo Horizonte: o secretário de Educação está há 12 anos no cargo, "sobrevivendo" a dois prefeitos diferentes. Essa continuidade é essencial para o sucesso? Mais importante do que manter uma única pessoa à frente da secretaria de ensino é garantir a continuidade de políticas públicas bem-sucedidas. De nada adiantaria esse senhor se manter tanto tempo no cargo se o trabalho que ele realiza fosse de má qualidade. Perpetuar o que é ruim não leva a nada.
Qual o perfil ideal de um secretário de Educação? Precisa ser uma pessoa com perfil gerencial, com competência para planejar. Não vejo a necessidade de ser um pedagogo ou um administrador, por exemplo. Independente da formação, precisa demonstrar habilidades de negociação. É preciso lembrar que esse é um cargo político. Por isso, o secretário deve ter uma boa articulação, pois precisará lidar com vários grupos. E, acima de tudo, tem que se cercar de pessoas competentes, que saibam fazer bem o que ele não sabe ou não pode fazer.
Que iniciativas vistas em Novo Horizonte devem servir de exemplo para todas as cidades? O que mais me chamou atenção foi o comprometimento desse município com a equidade. O secretário demonstrou ter clareza de que todas as suas escolas precisam seguir o mesmo passo. Desde o início, ele se preocupou em estabelecer um padrão para todas elas. Isso é pensar em rede.
Fonte: Veja.com

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