terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Os caminhos para a Educação Integral

Por muito tempo se pensou em organizar a jornada Escolar de tempo integral nas Escolas públicas apenas como forma de atender às necessidades dos pais que trabalham ou ofertar às crianças mais pobres oportuni­dades de utilização do tempo li­vre com atividades como artes e esportes, que Alunos de classe média recebem naturalmente de suas famílias. Os resultados do Brasil no Pisa nos obrigam a olhar com muita seriedade para os imensos desafios que ainda de­vem ser enfrentados se nos quisermos colocar não apenas entre as nações com economias forte, mas também entre as que têm chances de construir um futuro melhor para as novas gerações.
Esse olhar implica ir além das expectativas imediatas dos pais e oferecer mais que um espaço seguro ou oportunidades de di­versificação de repertório das crianças. Envolve a consolida­ção do que é básico na Educação: desenvolver a capacidade de leitura, interpretação e escrita, ra­ciocínio matemático e o fomen­to de mentes investigativas. Para isso, além da oferta de mais tem­po na Escola, deve-se trabalhar com mais tempo significativo de Ensino e enriquecimento de re­pertório. Ou seja, a escolha não é entre oficinas pós-Escola ou mais aulas, ambas são importantes.
Ao buscar um salto na qualida­de da Educação carioca, a partir de 2009, tínhamos consciência de que se deve iniciar o processo de transformação pela definição do que se espera que as crianças aprendam. Isto é, não iniciamos o trabalho fixando metas de es­colas em tempo integral, mas es­tabelecendo um currículo claro e instrumentos pedagógicos a ele associados. Prosseguimos o percurso investindo em duas peças-chave para a melhoria da aprendizagem: capacitação de Professores e constituição de um sistema forte de reforço esco­lar. Com essas medidas conseguimos avançar muito no índice de Desenvolvimento da Educa­ção Básica (Ideb) e em avalia­ções externas de que os Alunos do município participam.
Nas Escolas em áreas confla­gradas, onde crianças e jovens são mais vulneráveis, oferece­mos uma modalidade de educa­ção em tempo integral com ofici­nas após as aulas, com base no Mais Educação, iniciativa interes­sante oferecida pelo MEC. Nelas a Escola pôde selecionar, com base em critérios próprios, um gru­po de Alunos que frequentaram oficinas de artes, esportes e refor­ço Escolar. Para que tudo funcio­nasse bem um Educador comuni­tário acompanhava as crianças nas oficinas e fazia a ponte entre estas e as atividades mais acadê­micas. Dado o sucesso da iniciativa, resolvemos estender essa forma de estruturação do tempo in­tegral a mais Escolas, em especial as com desempenho educacio­nal mais fraco. Mas ainda não se tratava de Educação integral para todos e com uma grade curricu­lar de tempo integral.
Assim, embora essas Escolas te­nham apresentado desempenho melhor, percebemos que seria fundamental estender o tempo de aula reservado ao currículo básico para podermos, de fato, dar um salto na qualidade na educa­ção. Projeto de lei proposto na Câ­mara Municipal abriu uma opor­tunidade nessa direção. Estabele­cia o projeto a exigência de pôr toda a rede, progressivamente, em período integral. Numa rede formada por 1.074 Escolas, essa progressividade fazia muito sen­tido. Além disso, o Rio, mais que outras cidades, vive um processo acelerado de transição demográfica, dado que o número médio de filhos por mulher caiu para 1,6. Assim, se construíssemos rapida­mente o número de Escolas ne­cessárias para todos estudarem em tempo integral, em pouco tempo elas estariam ociosas.
Aprovada a proposta, elabora­mos um plano diretor para pôr toda a rede em turno único de se­te horas de aula para Escolas que atendem do 1° ao 6.° anos e de oito horas para as que têm Alunos do 7.º ao 9°, seguidas de oficinas de artes, esportes e reforço esco­lar. Nesse plano não previmos só obras e contratação de Professores, mas identificamos para cada território a dinâmica demográfi­ca prevista e quantas unidades de cada tipo de Escola seriam ne­cessárias, considerando a espe­cialização dos prédios Escolares por tipo de atendimento: espa­ços de desenvolvimento infantil, Ensino fundamentai I e II.
Mas não é suficiente pôr todas as Escolas em tempo integral. A carreira do Professor precisa ser adequada a essa realidade. Não faz sentido ter um Professor dan­do aulas em três Escolas diferen­tes, ou com uma carga horária de 16 horas, se os Alunos ficam o dia todo na Escola. A implantação da Escola em tempo integral é um bom momento para fazer ca­da Professor se dedicar integral­mente a apenas uma delas, com mais tempo para o processo de Ensino e para maior interação com os Alunos. Assim, a partir do final de 2010 passamos a realizar concursos apenas para professo­res com carga horária de 40 ho­ras. É um grande desafio de gestão definir o sequenciamento da construção de cada Escola, da lo­tação de Professores de 40 ho­ras, do investimento em forma­ção para assegurar um perfil mais voltado para a formação in­tegral do Aluno, que fica agora o dia todo no ambiente Escolar, e para trabalhar melhor com par­ceiros da comunidade que inte­gram as oficinas pós-Escola.
Esse novo perfil também in­clui elementos do que Edgard Morin chamou de religação dos saberes, a possibilidade de tor­nar o Professor o mediador do processo de aprendizagem, e não mero fornecedor de aulas, dentro de sua especialidade. Um Professor mais polivalente, espe­cialista não numa área específi­ca, e sim profundo conhecedor de como o Aluno aprende.
Esses cuidados, integrados a uma política educacional não fragmentada, com definição cla­ra do que se espera que a criança e o adolescente aprendam, po­dem estar no centro do proces­so do salto de qualidade que o Rio e o País precisam dar. Ainda falta muito, mas já dá para enxer­gar o caminho, que será longo e não sem percalços.
Fonte: O Estado de S.Paulo (SP)

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