segunda-feira, 4 de fevereiro de 2013

Vale a pena mandar os filhos para a escola?

A resposta é quase sempre automática, mas não deveria ser. Nós, pais, sem exceção, deveríamos fazer essa pergunta a nós mesmos antes de decidirmos confinar nossos filhos em uma sala de aula. O que justificaria tirar uma criança de casa cinco horas por dia, 200 dias por ano, quando ela, em liberdade, pode aprender muito mais e melhor? Deveríamos nos informar, ler, reler, cavar fundo, não sem antes chegar diante do espelho, sondar nosso coração e analisar profundamente nossas motivações. Quando se trata do futuro dos filhos, todo esforço empregado nessa tarefa ainda será pouco.
Aprendizagem, socialização, profissionalização, cidadania... Essas palavras fatalmente virão à tona diante dessa pergunta. Mas será que estaremos garantindo o futuro dos nossos filhos ao colocarmos uma mochila em suas costas e os enviarmos para a Escola? Será que um diploma garantirá a eles um lugar ao sol? “Dê raízes a seus filhos e, depois, asas”, diz o provérbio judaico. Se a nossa motivação é o futuro deles, deveríamos pensar sob a ótica deles e não em nós mesmos, sob o prisma das nossas conveniências.
O que garantirá que teremos no futuro filhos verdadeiramente prontos para a vida adulta? Será que a sociedade atual tem as respostas? Será que os especialistas de plantão podem indicar o caminho? Será que deveríamos entulhar a mente de nossos filhos de informações e adestrá-los para passar no vestibular? O que o conhecimento pode fazer por eles, se não aprenderem antes a lidar com ele? Há um dito popular que diz “Uma pessoa com conhecimento e sem sabedoria é como um burro que carrega uma carga de livros”. Januz Kosack, professor que foi eliminado nas câmaras de gás do regime nazista, disse “Eu não acredito na Educação, porque os médicos que cometeram atrocidades eram formados e muito Escolarizados”.
Nunca houve na história uma sociedade tão informada quanto a nossa; no entanto, nunca houve uma sociedade tão desprovida de valores. Jovens que só querem tchu e tchá, cujo lema é gozar a vida no sentido amplo e irrestrito. A maioria dos jovens estão entrando na vida despreparados. Não têm a menor ideia de o que é ser um pai ou uma mãe. Estão se preparando para serem profissionais, mas não estão se preparando para a vida.
A própria natureza nos dá a lição. Um pássaro sabe a hora de arremessar seus filhotes fora do ninho e nenhum especialista pode convencê-lo do contrário. Há algumas espécies que, no momento crucial, destroem o ninho. Mas infelizmente o Homo sapiens parece não ter a menor ideia. Pensam que precisam criar um ambiente artificial para que seus filhos aprendam a se socializar, quando podem aprender a se relacionar no mundo real. Pensam que seus filhos precisam passar a parte mais importante de sua existência trancados em uma sala para aprenderem a ser cidadãos, enquanto a vida pulsa dentro deles e no mundo ao redor.
Seria justo que uma criança já nascesse com uma sentença de no mínimo 13 anos de reclusão em um ambiente artificial onde até as brincadeiras são obrigatórias? Viver atrás das grades curriculares? Para quê? Para serem alguém na vida? Se a juventude de hoje for a resposta, não vale cumprir essa pena.
Cléber Andrade Nunes, designer autodidata, é fundador da Aliança Nacional para Proteção à Liberdade de Instruir e Aprender (Anplia), educou os dois filhos em casa a partir de 2006 e tem se dedicado a ajudar famílias que decidem assumir a Educação de seus filhos.

Por que ir a escola é insubstituível?
No Brasil constituímos uma ideia, legalmente incorporada, de que estar na Escola é um direito de todos os brasileiros e, ao mesmo tempo, um dever, pelo menos durante uma determinada parte da vida. Mas por que somos obrigados a ir a Escola? Não podemos abrir mão deste direito? E se avaliarmos que, para os nossos filhos, estudar em casa é uma opção mais adequada, podemos dispensá-los de ir a Escola? Nós defendemos a importância da frequência à Escola para todos.
A Constituição Federal (art. 208), o Estatuto da Criança e do Adolescente (art. 55, 129) e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (art. 6.º) atestam que pais e responsáveis são obrigados a matricular as crianças e mantê-las na Escola entre os 6 e os 14 anos de idade, pelo menos. A partir de 2016, o período de Escolaridade obrigatória será ampliado para 14 anos: dos 4 aos 17 anos de idade todos os brasileiros deverão estar na Escola. Essa ampliação traz um aspecto importante, que é a obrigatoriedade para o Estado na ampliação da oferta educacional, de Pré-Escola (para crianças de 4-5 anos) e de Ensino médio (para jovens dos 15 aos 17 anos de idade); se esses cidadãos deverão estar matriculados, é preciso, antes, que existam Escolas em suficiência para todos eles, o que representa um aumento de 800 mil vagas na Pré-Escola e mais de 1 milhão no Ensino médio.
A despeito do texto legal, não poderíamos mesmo abrir mão do direito à Escola e educar os nossos filhos em casa? Acreditamos que não. A Escola tem três funções sociais muito importantes. A mais conhecida é a de garantir acesso ao conhecimento. Sabemos que a Escola não é a única agência capaz de fornecer tal acesso. Ainda assim, o conhecimento organizado pela Escola (nos seus tempos e espaços especializados), com intenções, fins e objetivos específicos, que se articulam tanto ao desenvolvimento humano no sentido mais amplo quanto às outras esferas sociais, parece ainda ser insubstituível.
Contudo, os outros dois papéis sociais são tão ou mais importantes que o primeiro. Trata-se da tarefa de socialização. A família tem um papel fundamental no processo de socialização inicial das crianças e adolescentes; no entanto, a Escola tem uma responsabilidade grande em colocar-nos em processo de socialização secundária, pois se aprende muito (e quiçá mais!) sobre a vida em sociedade convivendo com outras pessoas, que são parecidas e ao mesmo tempo tão diferentes.
A alternativa de estudar em casa deve ser tomada, a nosso ver, como condição complementar ou suplementar, como um “algo a mais”; ou substitutiva apenas em casos muito especiais, nos quais seja fisicamente impossível frequentar a Escola – e, nesse caso, apenas temporariamente, enquanto perdurar aquela situação de necessidade extrema.
O convívio com outras crianças e adolescentes é fundamental para a formação humana. Aprende-se muito na Escola enquanto se aprendem os conhecimentos curriculares: aprende-se a solidariedade, as diferenças e o respeito, sobre as dificuldades e sobre como enfrentá-las coletivamente. A Escola contribui muito confirmando a cidadania das crianças e adolescentes, pois, decorrente das duas tarefas anteriores, a Escola tem o papel de formar a/para a cidadania, uma vez que articula aqueles conhecimentos em um contexto social e cultural. Assim, frequentar a Escola significa potencialmente forjar-se mais e melhor cidadão.
Ângelo Ricardo de Souza e Adriana Dragone Silveira, professores e pesquisadores, in: Gazeta do Povo (PR)

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