Se o ministro Aloizio Mercadante tivesse filho em idade escolar e o matriculasse em escola particular, saberia que a idade certa para alfabetizar é 6 anos.
Por que o MEC propõe que isso ocorra aos 8 anos na escola pública? Dois Brasis? Ministros não precisam ser especialistas e os recém-chegados ao posto têm direito a período de aprendizagem. Nada como examinar as melhores práticas e a evidência científica para aprender rápido.
Num sistema educativo ordenado, tudo se inicia com o currículo, que estabelece o que o aluno deve aprender, de preferência em cada série escolar. Um currículo, portanto, também define quando o aluno deve ser alfabetizado.
Decidir quando o aluno deve se alfabetizar não pode depender da crença ou vontade de secretários de Educação. É direito fundamental do aluno. Vale lembrar que currículo nada tem a ver com métodos de ensino. O Brasil não tem currículo há décadas.
Como saber a idade certa para alfabetizar? No país, há inúmeras experiências bem-sucedidas. Praticamente todas as escolas particulares alfabetizam aos seis anos. E há pelo menos algumas dezenas de municípios de tamanho e nível de desenvolvimento variado que o fazem de maneira regular e sistêmica em todas as escolas da rede pública.
No plano internacional, os países que adotam o código alfabético de escrita alfabetizam os alunos no 1º ano da escola formal. Há duas exceções. Os de língua inglesa, que levam mais tempo (3 anos) por conta da quantidade de fonemas e da complexidade do código ortográfico.
E os de língua francesa, que ensinam a ler no 1º ano, mas até o final do 2º muitas crianças apresentam dificuldades ortográficas conhecidas: uma palavra com o som ô pode se escrever o, ô, ot, au, eau, eaux, etc. O sistema de escrita da língua portuguesa tem complexidade média, pode ser aprendido em quase sua totalidade ao final de um ano de uma boa escola.
A evidência científica também permite definir o que seja alfabetizar e entender o conteúdo, a natureza e o processo de alfabetização. A Ciência Cognitiva da Leitura — ignorada pela comunidade acadêmica e pelo MEC, mas reconhecida como paradigma científico da área — tem suas respostas. A Academia Brasileira de Ciências publicou um relatório sobre o tema em 2011 que valeria ser levado a sério pelas novas autoridades.
Como saber que um aluno é alfabetizado? Proposta pelo MEC, a Provinha Brasil não tem consistência conceitual nem metodológica e sua aplicação não obedece a nenhum rigor. Somente um teste apoiado em definição científica rigorosa de alfabetização permitirá avançar. Por coincidência, os bons testes medem exatamente o que o povo comum pensa a respeito de o que é alfabetização: nada mais simples do que um teste de leitura e ditado.
O Brasil precisa de um programa de ensino, de professores formados adequadamente, de materiais didáticos consistentes e de alta qualidade, como também de avaliação consistente. E requer de um ministério que estabeleça poucas e vigorosas políticas e incentivos para redes de ensino com bons resultados, não que seja balcão de programas e campanhas.
O programa Alfabetização na Idade Certa, tal como proposto, não avança em nada e retrocede no essencial. O novo ministro tem todo o direito — e o dever — de chamar a si essa responsabilidade. Com todo o respeito, antes de embarcar em canoas furadas, é como se Mercadante tivesse que se “alfabetizar” nos vários temas sobre os quais vai tomar importantes decisões.
João B. A. e Oliveira, presidente do Instituto Alfa e Beto, in: Correio Braziliense (DF)
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