O Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) é uma boa ideia que padece de vários males. A prova, implementada inicialmente pelo Ministério da Educação com o objetivo de avaliar a qualidade do ensino médio brasileiro, teve seu uso ampliado ao longo do tempo, passando a funcionar também como mecanismo de acesso a algumas universidades públicas, por meio do Sistema de Seleção Unificada (Sisu).
A tentativa de estabelecer um único exame como um dos parâmetros de avaliação do ensino no país e como forma opcional para o ingresso em universidades possui grande relevância – e o agora ex-ministro da Educação Fernando Haddad nunca escondeu de ninguém seu sonho de fazer com que todas as instituições públicas de ensino superior adotassem o Enem como método único de seleção.
Mas reiteradas falhas e disputas judiciais acabaram gerando insegurança e dúvidas nos alunos, professores e sociedade, que passaram a colocar em xeque a possibilidade de o Enem ser considerado um instrumento idôneo e eficiente para atingir os objetivos a que se propõe.
O imbróglio jurídico mais recente envolvendo o exame foi noticiado na semana passada, quando, em 24 de janeiro, o Tribunal Regional Federal da 5.ª Região (TRF5) suspendeu a liminar que permitia o acesso de estudantes a provas e espelhos de correção das redações do Enem de 2011.
O Ministério Público Federal tinha pedido à Justiça Federal cearense que o direito de acesso à redação e revisão de nota, que já havia sido garantido para 12 alunos, fosse estendido a todos os candidatos do país. Até então, 71 alunos haviam obtido na Justiça o direito ao acesso à correção da redação.
Os pedidos foram pautados em um problema concreto e que jogou dúvidas sobre os cuidados e critérios de correção de provas subjetivas: por decisão judicial, o MEC precisou alterar a nota da redação de um estudante paulista, que passou de zero a 880, numa escala em que a pontuação máxima é mil. Esta foi a primeira vez em que o ministério se viu obrigado a rever a nota auferida a um aluno.
Além disso, o Enem sofre com denúncias de vazamento de questões e provas. No exame de 2011, 14 questões foram anuladas em Fortaleza por causa de vazamentos, atingindo 1.139 alunos. Estudantes do Colégio Christus, de Fortaleza, tiveram acesso antecipado às questões da prova em uma apostila da escola.
Num passado não muito distante, em 2009, a prova vazou, foi cancelada e uma nova avaliação teve de ser estruturada. O incidente onerou os cofres públicos em milhões de reais e, ainda, causou diversos transtornos aos estudantes, pois a data do teste foi remarcada e acabou coincidindo com vários vestibulares no Brasil.
Para completar a sucessão de problemas, em 2010, houve erros de impressão em um lote de provas, com questões e cabeçalhos invertidos, o que ocasionou confusão para parte dos alunos. Também foram constatadas, no mesmo ano, no sistema eletrônico de inscrições do Sisu falhas que levaram o presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Joaquim Soares Neto, a deixar o cargo ainda no início de 2011.
A judicialização do teste, o vazamento de questões, o cancelamento do exame e os problemas de impressão de provas são episódios que acabam por minar a confiança no Enem.
Isso é nocivo porque, com um porcentual baixo de participação, o MEC não consegue fazer uma avaliação aprofundada do ensino médio brasileiro. Para se ter uma noção da pouca participação de estudantes no exame, no ano de 2010, em 60% das escolas do país menos da metade dos alunos prestaram a prova.
Além disso, tantas falhas em anos consecutivos têm gerado em grande parte dos vestibulandos brasileiros dúvidas e incertezas com relação a seu ingresso em universidades públicas.
Para citar dois exemplos apenas no Paraná, as duas maiores instituições de ensino público federal do estado – Universidade Federal do Paraná (UFPR) e Universidade Tecnológica Federal do Paraná (UTFPR) – utilizam de maneiras diferentes o exame em seus métodos de seleção.
No caso da UFPR, 10% da avaliação do candidato é composta pela nota do Enem; já a UTFPR faz parte do Sisu, ou seja, utiliza exclusivamente o desempenho do vestibulando no exame nacional.
O que se espera é que o novo ministro da Educação, Aloizio Mercadante, tenha empenho em corrigir – e não repetir – os erros do passado que fragilizaram o Enem.
O exame, se bem aplicado, pode decidir os rumos de muitos jovens brasileiros, ao mesmo tempo em que pode se mostrar um excelente indicador para estabelecer outras políticas públicas de ensino. É desejável que as mudanças ministeriais impliquem não só acomodações políticas, mas novas realidades para a Educação brasileira.
Fonte: Gazeta do Povo (PR)
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