Apesar de o Estatuto da Criança e do
Adolescente (ECA) assegurar o direito ao acesso amplo e irrestrito à educação
por todos os jovens, incluindo os em conflito com a lei, as escolas públicas
brasileiras têm dificuldade em incluir e integrar os adolescentes que cometeram
atos infracionais, possibilitando que eles permaneçam na instituição.
Um estudo realizado por Aline Fávaro
Dias no Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de São
Carlos (UFSCar) identificou alguns dos fatores que facilitam ou dificultam a
permanência na escola de jovens infratores. O trabalho ganhou o Prêmio Crefal
de Melhores Teses sobre Educação de Pessoas Jovens e Adultas, edição 2011,
concedido pelo Centro de Cooperação Regional para a Educação de Adultos na
América Latina e no Caribe (Crefal) - um organismo internacional de cooperação
na área de educação, apoiado pela Organização das Nações Unidas para a
Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco).
O estudo também resultou em um
capítulo de um livro organizado por Dias e publicado no fim de maio. No estudo,
Dias, que é graduada em psicologia, realizou entrevistas e acompanhou seis
adolescentes que cumprem medidas socioeducativas em regime de liberdade
assistida pelo Programa de Medidas Socioeducativas em Meio Aberto de São
Carlos, com o intuito de compreender o significado que eles atribuem às suas
vivências escolares.
Dias constatou que, em geral, os adolescentes
- que apresentam baixa escolaridade e histórico de repetência, expulsão e
evasão escolar - veem a escola de uma forma ambígua. De um lado, apesar de a
escola ser avaliada por eles como um espaço onde são estigmatizados, excluídos
e rotulados, por outro lado, a instituição também é vista por esses jovens como
um ambiente de socialização, onde podem fazer amizades, paquerar e namorar. Já
o conteúdo escolar é considerado como desinteressante e algo secundário.
"Eles invertem a função da
escola. O aprendizado, que é considerado primordial para a escola, carece de
sentido para eles por não conseguirem ver uma aplicação prática no dia a dia do
conteúdo que aprendem, e a sociabilidade passa a ser o aspecto mais
importante", disse Dias.
Segundo a psicóloga, além da falta de
vínculo do conteúdo escolar com a realidade, outros fatores que contribuem para
essa percepção invertida dos jovens infratores sobre a escola são o próprio
envolvimento desses adolescentes em atos infracionais, que faz com que se distanciem
da instituição, além da baixa escolaridade dos pais e a dificuldade da
instituição escolar em lidar com eles. "De modo geral, as instituições de
ensino possuem pouca informação sobre o ECA e sobre quais são as medidas
socioeducativas previstas para um jovem que cometeu um ato infracional",
disse.
Em função dessa carência de
informação, as escolas tendem a excluir e a rotular esses jovens - que podem
possuir maior dificuldade de aprendizagem e de relacionamento com os colegas -
como perigosos ou a responsabilizá-los por tudo o que acontece de ruim na
instituição, como atos de vandalismo.
"A escola acaba vendo esses
jovens como problemáticos e que talvez se não estivessem ali seria melhor. É
muito comum a prática de expulsão e transferência compulsória desses
adolescentes, passando o problema de uma escola para a outra e não resolvendo,
de fato, a situação deles", disse Dias.
Segundo ela, a maioria dos jovens em
conflito com a lei tem dificuldade de encontrar vagas nas escolas, fazendo com
que desistam de estudar ainda no ensino fundamental. "Eles reconhecem que
a escola e o estudo são importantes, mas mesmo reconhecendo isso não conseguem
permanecer na instituição", afirmou.
Fonte: Terra
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