Do atendimento ao pai de um aluno indisciplinado à avaliação da limpeza das classes, o coordenador pedagógico é responsável por uma série de atividades que não lhe dizem respeito e acaba omisso em sua principal função: a formação contínua dos docentes. A constatação é resultado de uma pesquisa da Fundação Victor Civita, à qual o Estado teve acesso com exclusividade.
O levantamento, que ouviu 400 coordenadores de 13 capitais brasileiras, mostra que, enquanto 72% deles acabam responsáveis por fiscalizar a entrada e a saída de alunos - trabalho de bedel, como são chamados os inspetores no ambiente escolar -, só 19% dão atendimento individual aos professores.
"Ele começa a funcionar como braço direito do diretor. Recebe um cabedal de atividades e não sabe dizer não", explica Angela Dannemann, diretora executiva da Fundação Victor Civita.
Na lista de atividades fora do escopo do coordenador, mas executadas por ele, constam: visitar empresas para fechar parcerias, cuidar de questões financeiras e burocráticas e até substituir os professores que faltam: 19% dos entrevistados relataram que dão aula uma ou algumas vezes por semana e 55% conferem se as salas de aula estão organizadas e limpas.
Uma das razões para esse desvio de função advém da carência de uma formação específica para a função. A maioria dos coordenadores pedagógicos não tem formação em gestão: saíram da sala de aula como professores e assumiram o cargo sem conhecer e dominar competências e estratégias próprias.
Dos 72% de coordenadores que trabalham na fiscalização da entrada e saída dos alunos, por exemplo, 91% deles acreditam que é uma atividade apropriada à função. Em contrapartida, 47% deles não souberam dizer o resultado de sua escola no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB).
"A verdade é que nem a escola sabe para que ele existe. Nem ele sabe sua atribuição. Com isso, faz uma série de ações e deixa de lado a parte pedagógica, que é a formação continuada do professor", diz Ana Maria Falcão de Aragão, da Faculdade de Educação da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).
Formação
Para que o cenário mude, é preciso investir na formação adequada desse coordenador pedagógico. Hoje, a existência da função depende de políticas estaduais e municipais e, segundo Angela, não existe um curso de formação específica para a atividade.
Para que o cenário mude, é preciso investir na formação adequada desse coordenador pedagógico. Hoje, a existência da função depende de políticas estaduais e municipais e, segundo Angela, não existe um curso de formação específica para a atividade.
"Muitos saem da sala de aula para a coordenação sem estarem preparados para o novo cargo. Como não há um plano de carreira docente, tornar-se gestor é a única forma que muitos professores enxergam como promoção. Não deveria funcionar assim. As atribuições são distintas e é preciso estar preparado."
Para ser coordenador pedagógico, é preciso dominar conceitos que ultrapassam o aprendido na academia. "A formação tradicional em Pedagogia e os cursos que costumam ser propostos pelas secretarias de Educação, como os que ensinam a trabalhar com aluno especial ou a alfabetizar melhor, são pouco para o que a função exige", afirma Vera Trevisan de Souza, da PUC-Campinas.
"O que o coordenador precisa aprender, de fato, é a traduzir políticas públicas voltadas à escola, conduzir o projeto político pedagógico, fazer mediação do currículo", completa a professora.
Solução
Um dos passos para a valorização do coordenador pedagógico é primário: o reconhecimento de sua existência. No Plano Nacional de Educação, em trâmite no Congresso, não há referência à função.
"A meta 19 fala da gestão escolar, mas se esquece do coordenador. A aprendizagem é o grande desafio da Educação e quem trabalha a qualidade do docente é justamente o coordenador", diz Mozart Ramos, do movimento Todos Pela Educação.
A profissionalização, segundo a professora Ana Maria, da Unicamp, é outro passo importante. A pesquisa mostrou que apenas 33% dos coordenadores foram selecionados por concurso público. O restante entrou por indicação ou seleção técnica, entre outros critérios.
"É muito comum o coordenador ser indicado pelos seus pares para ficar por um tempo determinado. Daí fica complicado, porque se ele propõe grandes alterações, seu pescoço está a prêmio. É uma relação muito doméstica. Se todos fossem concursados, seria muito melhor".
Fonte: O Estado de São Paulo (SP)
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