quinta-feira, 30 de junho de 2011

Salário de professores é só a ponta do iceberg dos problemas

Ao longo das últimas décadas, a Educação básica se expandiu quantativamente no Brasil. Em 2006, do total de pessoas entre 7 e 14 anos, 96% estavam matriculadas no ensino fundamental (1.ª à 8.ª série), etapa adequada para a faixa etária. Com a ampliação do acesso a essa fase da Escolaridade, os desafios mudaram de lugar. Para o professor Cláudio de Moura Castro, o próximo passo é investir na qualidade do ensino. 
Segundo Castro, porém, consertar a Educação requer muito mais do que jogar dinheiro no sistema: é necessário tornar os gastos mais eficientes. Nesta quinta-feira, às 8h30, o professor ministrará a palestra “Caminhos e alternativas para o ensino de qualidade no Brasil”, no Hotel Pestana. Depois haverá uma apresentação do prefeito de Curitiba, Luciano Ducci. 
Promovido pelo Grupo Positivo em parceria com a Gazeta do Povo e o Sindicato das Escolas Particulares do Paraná (Sinepe/PR), o evento abrirá os trabalhos do Sala Mundo 2011 – Encontro Internacional de Educação, que será realizado em Curitiba nos dias 17 e 18 de agosto. Confira a entrevista concedida pelo economista, por e-mail, à Gazeta do Povo.

Depois de o Brasil praticamente universalizar o ensino fundamental, quais são os principais desafios para a próxima década?
Qualidade. Qualidade. Qua­lidade.

A democratização do acesso pode se tornar inócua se não for garantido o direito à Educação de qualidade para amplos contingentes da população?
Não. A universalização, em si, já é um grande avanço na democratização. Significa que deixaram de existir as horrendas diferenças de Escolaridade mínima da população. Porém, apesar de significar muito, é apenas um primeiro passo. O próximo é qualidade para todos. 

O Plano Nacional de Educação (PNE), em discussão no Con­­gresso Nacional, prevê 20 metas a serem alcançadas até 2020, entre elas que 50% das crianças de até 3 anos tenham acesso à creche. Como o senhor avalia essas metas?
Nada de errado nas metas. O problema do PNE é que não mostra o caminho para chegar lá. A equação financeira é mais do que ambígua. Chegar a 7% do PIB. Bela meta! Mas quem paga a conta e quem obriga a pagar? No caso da creche, talvez seja a meta mais fácil, pois é politicamente atraente. Pais querem um estacionamento para seus filhos durante o dia. Prefeitos querem satisfazer os pais/eleitores e inaugurar obras. 

É necessário aumentar o montante de recursos aplicados em Educação para cumprir as metas previstas no PNE?
Essa pergunta só pode ser respondida se soubermos quanto é possível remanejar gastos. Gastamos o mesmo que países com sistemas educativos muito melhores do que o nosso. Só que exageramos nos gastos públicos com o superior e gastamos de menos na Educação básica. Dá para corrigir essa distorção? Há também muita ineficiência nos gastos. Se reduzirmos tais desperdícios, conseguiremos mais com menos recursos.

O PNE também prevê igualar o salário dos professores ao de outros profissionais de nível superior. Os professores brasileiros ganham mal?
Essa pergunta entra em um pantanal metodológico. Salário Mensal ou Salário Hora? Se considerarmos salário hora, os professores não ganham menos, pois têm uma jornada mais curta. Há também uma série de vantagens inerentes ao serviço público que afetam a atratividade da carreira docente (estabilidade, aposentadoria integral e precoce, etc). Ademais, há uma grande variação entre estados e municípios. 

Salários maiores são parte de um conjunto de elementos essenciais para garantir um ensino de qualidade superior?
Eis outro terreno minado. Aumentar salário não é necessário e nem suficiente para melhorar o ensino. Além disso, melhorar quanto? Dobrar talvez melhore a qualidade. Mas é orçamentariamente impossível. Melhorar de quais professores? Compa­rando estados brasileiros, não há qualquer correlação entre salário e qualidade. Estados como Minas Gerais e Santa Catarina são dos que menos pagam e estão no topo da distribuição de qualidade.
Roraima paga muito e consegue pouco. O que parece importar mais é o ambiente da Escola. Quando a Escola tem uma atmosfera agradável, quando há bons fluidos, o salário aparece menos como problema citado pelos professores. Quando a Escola é psicologicamente insalubre, os professores reclamam dos salários. Ou seja, salário é apenas a ponta do iceberg.

O senhor é a favor do pagamento de bônus por desempenho, a chamada meritocracia? Isso não coloca muita responsabilidade sobre a qualidade do ensino nas costas dos professores e desobriga o Estado de oferecer condições adequadas?
Esse é um argumento tolo. A qualidade da Educação resulta de um conjunto grande de fatores. Não há nenhuma razão para acreditar que um governante vai enfrentar os vendavais políticos para criar bônus para desempenho e, de outro lado, abandonar as outras frentes de melhoria do ensino. Isso seria de uma burrice política incomum. É pagar o preço político de uma mudança mal recebida e não ganhar os dividendos, também políticos, de melhorar a qualidade.

A presidente Dilma lançou neste ano o Pronatec (Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico) e disse que repetiria no ensino técnico a experiência bem-sucedida do ProUni. Como o senhor avalia esses dois programas?
O Prouni é demonstravelmente um grande sucesso – um dos maiores dos últimos anos na área da Educação. O Pronatec pode repetir a proeza, embora a proposta original tenha pequenos cacoetes que podem ser corrigidos
Fonte: Gazeta do Povo (PR)

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