quinta-feira, 30 de junho de 2011

Educadores discutem as aulas dobradas

Durante quatro anos, a Escola Municipal Erasmo Pilotto, no Bairro Alto, experimentou uma forma diferente de organização do tempo das aulas. O colégio adotou o sistema de dobradinha, com duas aulas seguidas de cada disciplina, para as turmas do 6.º ao 9.º ano do ensino fundamental.
O objetivo era evitar o desperdício de tempo com a troca constante de professores – e a consequente necessidade de acalmar a turma antes do início das atividades. Nem tudo, entretanto, saiu conforme o planejado. Nas turmas mais agitadas, os professores passaram a ter dificuldade de manter os alunos concentrados. Além disso, um único dia de falta fazia com que os estudantes perdessem uma quantidade expressiva de conteúdos da mesma disciplina.
A experiência mostra que a ampliação da duração das aulas nem sempre tem impacto positivo na aprendizagem. Embora a expansão da jornada seja uma ótima oportunidade para aplicar técnicas diversificadas de ensino, manter o aluno concentrado nas explicações por mais de uma hora não é tarefa fácil.
“Em algumas áreas, a produção dos alunos era melhor, porque eles ficavam envolvidos com o trabalho por um tempo maior. Mas o resultado dependia do perfil de trabalho do professor e também da turma. Houve um desgaste interno em função dessas dificuldades, até pela estrutura física e material da escola, já que você precisa diversificar as estratégias para manter o foco na aula”, afirma a diretora da escola, Janete Luiza Araújo.

Equilíbrio entre as duas modalidades é a solução
No Colégio Internacional de Curitiba, a solução encontrada para desenvolver atividades pedagógicas que exigem mais de 50 minutos, sem tornar os estudos exaustivos, foi equilibrar aulas simples com aulas geminadas. A partir do 6º ano do ensino fundamental, quando os alunos passam a ter várias disciplinas específicas, algumas aulas são dadas de forma blocada.
“Não é preciso dobrar todas as aulas. Mas nós consideramos que 50 minutos, principalmente para os estudos sociais e as aulas de Inglês, são insuficientes. Nas aulas mais longas, o professor pode desenvolver oficinas de escrita, apresentando um tema para aluno, discutindo o assunto e propondo a elaboração de um texto”, explica a diretora do programa brasileiro da escola, Cláudia Lebiedziejewski.
A professora de Português Ana Cláudia de Almeida Rocha, que leciona para o ensino médio, conta que as aulas duplas são fundamentais para desenvolver projetos maiores, como seminários, debates e oficinas de texto. “A gente tem de cinco a seis aulas por semana com cada turma do ensino médio. Dessas, com certeza duas são geminadas”, afirma.
Segundo ela, o sucesso das aulas mais longas depende dos estímulos utilizados pelos professores. “Não vou usar toda a aula para trabalhar um item extremamente teórico, que exige só a passividade do aluno. O ideal é desenvolver atividades que exigem maior atenção na primeira aula e partir para a produção na segunda”, diz.
Para a professora Marlene Mattevi Roncato, do curso de Pedagogia da Universidade Tuiuti do Paraná, não há motivos para ampliar a duração das aulas se o professor não conseguir diversificar as atividades. Mesmo assim, ela considera insuficiente o tempo normalmente dedicado a cada disciplina.
“Percebo nos estágios, no contato com a prática dos professores, que as aulas acabam se resumindo a 30 minutos de trabalho efetivo. Se o tempo fosse maior, em vez de ficar só com o livro didático, o professor poderia explorar outras fontes de apresentação do conteúdo, como artigos científicos e documentários”, afirma.
De acordo com a diretora do Colégio Internacional, o bom desempenho escolar não está associado apenas ao tempo maior dedicado a algumas aulas, mas ao pequeno número de alunos por turma, o que permite um ensino mais personalizado. “Nossa grande vantagem é que escola é pequena, com uma média de 20 alunos por sala. Não acho que dar aulas geminadas para grupos de 50 alunos fará diferença”, conclui. (MC)
A explicação para a desatenção dos alunos também está no relógio biológico. O neurocientista Fernando Louzada, do Laboratório de Cronobiologia Humana da Universidade Federal do Paraná (UFPR), explica que não é possível manter a atenção por mais de uma hora e meia. Os cientistas descobriram que a cada 90 minutos a concentração atinge um pico e um vale, ou seja, o cérebro vai da concentração total à distração completa.
De acordo com Louzada, os intervalos entre as aulas podem se transformar em estímulo para os estudantes. Mas também é possível “retirar os alunos do vale” a partir de outros incentivos externos. “O professor pode tocar uma música ou mostrar imagens, utilizar algo que tenha muito significado para o aluno. O importante é impor diferentes ritmos ao longo dessa uma hora e meia”, diz.

Mais aulas curtas
Entre os pesquisadores da área de Educação, a importância da oferta do ensino em período integral é ponto pacífico. Mas ainda não há consenso sobre a melhor forma de organização desse tempo adicional. A pedido do Instituto Ayrton Senna e do movimento Todos pela Educação, um grupo de estudiosos mapeou as pesquisas nacionais e internacionais existentes a respeito das condições que impactam a aprendizagem.
Segundo André Portela Souza, que participou do mapeamento e é professor da Escola de Eco­­nomia de São Paulo da Fundação Getulio Vargas, estudos internacionais mostram que o aumento da jornada escolar diária deve acontecer por meio da expansão do número de aulas, e não pelo aumento da duração de cada aula.
“Quanto mais tempo de exposição à aprendizagem, melhor. Mas a divisão do tempo deve ser feita de forma produtiva. Você não deve expor o aluno à mesma matéria durante um longo tempo”, afirma Portela, citando dois estudos realizados por universidades norte-americanas.
Segundo uma pesquisa de 2001 da Universidade de Maryland, a performance de alunos de ensino médio em aulas blocadas de matemática foi pior do que em aulas simples. Segundo o estudo, o desempenho dos estudantes caiu 6% em relação à média para cada acréscimo de 10 minutos na aula.
Fonte: Gazeta do Povo (PR)

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