Quando se pergunta sobre a importância da leitura, há uma quase unanimidade acerca de sua importância. Em nossa sociedade, o valor da leitura é apreendido como fundamental, e 88% dos entrevistados dizem isso. Mas entre essa afirmação genérica e a prática há uma grande distância. Quando perguntados se conhecem alguém que "venceu na vida" por ler, 47% dos entrevistados dizem que não, e mais 8% não sabem. Há uma percepção social da importância da leitura e uma prática não leitora, que se deve a muitos fatores: Escolaridade (tempo na Escola e qualidade do ensino), renda, acesso, deficiências físicas (visuais) etc. A "ponte" entre formação profissional, sucesso, "vencer na vida" e leitura se perde na prática. Tudo indica que, neste caso, os entrevistados igualam leitura apenas com "leitura literária" e não consideram as leituras técnicas e científicas, por exemplo.
O papel da renda e da Escolaridade nos índices de leitura
Renda e Escolaridade são os dois fatores que têm maior influência nos índices de leitura. Essa tabela evidencia esse fenômeno de forma claríssima: quanto maior o nível de renda e de Escolaridade, maior o índice de leitura. A Escolaridade é o fator mais importante dos dois. A quantidade de pessoas com renda de mais de dez salários mínimos é menor que a quantidade de pessoas com Educação superior. A chamada classe A corresponde a apenas 2% da população total do país, enquanto os de nível superior de Educação correspondem a 11% da população (Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílios). Os leitores classe A são apenas 1% do total, e os com ensino superior são 16%. Entretanto, em números absolutos, são as classes B e C e os que completaram o Ensino Médio que constituem o segmento com mais leitores: 56% entre os que têm Ensino Médio e 81% nos que estão nas classes B e C.
Existem diferenças regionais significativas nos resultados?
Não se constatam diferenças nos índices de leitura e na compra de livros que possam ser atribuídas exclusivamente a fatores regionais. As diferenças que existem e aparecem entre as regiões se devem a fatores específicos de renda e Escolaridade. Por exemplo, o aumento dos índices de Escolaridade no Nordeste, nos últimos anos, reflete-se na pesquisa. Não por ser Nordeste, mas por conta do investimento mais intenso no sistema educacional da região, que recupera atrasos. O fato de as regiões Sudeste e Sul lerem e comprarem mais livros se deve a um fator de concentração de renda mais do que qualquer outro. Ou seja, a homogeneidade cultural do Brasil se revela também nesse aspecto, ao contrário de outros países onde fatores como línguas diferentes e tensões autonomistas eventualmente têm um papel relevante.
O número de compradores de livros cresceu?
Aumentou o número de compradores de livros. Eram 45% dos que liam em 2007 e passaram a ser 48% em 2011. O mais notável foi o aumento do número de compradores com idade acima dos 18 anos. Todas as faixas etárias aumentaram significativamente. O que isso quer dizer? As políticas de leitura nas Escolas, vagarosamente, mas de forma consistente, aumentam o interesse (e a compra) de livros fora da idade Escolar, apesar de o maior número de leitores ainda ser de estudantes. A renda, entretanto, ainda é um fator limitador para a compra de livros. Mas os números são impressionantes: são 1,978 milhões de compradores na classe A; 15,616 milhões na B; 20,79 milhões na C e 4,089 nas classes D e E. São 42,3 milhões de compradores no total, contra 36,35 milhões em 2007. Ou seja, a massa de leitores diminuiu, mas entre esses leitores o número de compradores de livros aumentou. De qualquer maneira, 85% dos entrevistados não compraram nenhum livro nos últimos três meses.
Por que as pessoas dizem que conhecem as bibliotecas e não as frequentam?
O Censo Nacional das Bibliotecas Públicas Municipais, de 2009, nos dá indicações. Apesar de existirem em 99% dos municípios, as bibliotecas são reconhecidamente mal equipadas. Apenas 25% delas têm mais de dez mil títulos no acervo; em 88% delas o acervo só aumenta por doações; apenas 12% abrem aos sábados, e só 1% abre aos domingos. As pessoas sabem que existe a biblioteca, mas não encontram nela o que buscam. O conjunto dos dados mostra que 70% dos que usam bibliotecas são estudantes. Resultado: 67% dos entrevistados sabem que existe biblioteca, mas apenas 7% as usam frequentemente, e 17%, ocasionalmente. Apenas 26% dos entrevistados têm acesso a livros por meio das bibliotecas. A faixa dos 5 aos 24 anos é a que mais usa as bibliotecas. O esforço para o equipamento das bibliotecas públicas e a instalação de bibliotecas Escolares deve ser intensificado. A população não usa mais as bibliotecas porque essas estão muito abaixo do mínimo de qualidade e quantidade de acervo e serviços desejáveis, e isso se reflete nos índices de leitura.
Os livros digitais
As informações sobre leitura de livros em formato digital são importantes para futuras comparações. Os leitores de e-books não são mencionados, registrando-se apenas a leitura em computadores. Já há uma base de tablets e e-readers no Brasil, mas ainda é pequena. O Programa Nacional do Livro Didático 2014 incluirá materiais digitais, com possível distribuição de tablets pelo MEC. Isso e a redução do preço dos e-readers podem aumentar a presença do livro digital.
O papel de Escola, imprensa e religião nas escolhas de leitura
Ao se falar de gêneros "lidos" é necessário tomar algumas precauções. A Bíblia não apenas é o livro mais vendido na maior parte do mundo (exceção do Oriente), mas também o mais citado como "leitura". Sabemos, entretanto, que a leitura da Bíblia se reveste de circunstâncias e formalismos: são versículos lidos aleatoriamente ou em função de cerimônias religiosas, às vezes seguindo um calendário próprio. O mesmo acontece com os livros didáticos, lidos em função de uma situação particular da vida das pessoas. A presença de livros religiosos em terceiro lugar, autoajuda em nono e esoterismo em 19º revela uma forte necessidade de buscas espirituais/filosóficas por parte dos leitores. A influência da Escola se revela em vários gêneros: didáticos, literatura infantil, literatura juvenil, poesia e dicionários e enciclopédias, assim como livros técnicos, todos fortemente vinculados às atividades Escolares e às leituras determinadas por professores. Culinária/artesanato/assuntos práticos e viagens revelam um interesse utilitário dos leitores. Finalmente, romances e as categorias restantes é que denotam o interesse pela leitura desvinculada de interesses extraliterários. A julgar pelos gêneros, a leitura da maioria das pessoas está muito vinculada a aspectos práticos de variados tipos, apesar da declaração de que a leitura "por prazer" seja feita por 75% dos entrevistados, contra 25% dos que leem "por obrigação". Mais uma incongruência entre o discurso e a prática.
Fonte: O Globo (RJ)
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