Uma pesquisa da Fundação Victor
Civita de 2011 revelou que 42% dos diretores de escolas públicas brasileiras
são escolhidos por influência política. É uma pena. Em Nova York, o trabalho da
organização Leadership Academy (Academia de Liderança) aponta que os maiores
avanços no desempenho escolar dos alunos são obtidos com diretores muito bem
treinados para a função, profissionais que, além de bons gestores, conhecem o
conteúdo programático de suas unidades de ensino. Criada em 2003, a instituição
ajudou a formar um em cada seis diretores de escolas públicas da cidade
americana, que estão concentrados principalmente em áreas de maior
vulnerabilidade, como o Bronx. “Liderança é a alavanca que impulsiona a mudança
em uma escola. O diretor define a melhoria e alinha tempo, dinheiro e
recursos”, afirma Irma Zardoya, presidente da Academia. Irma, que participa de
um ciclo de debates no Brasil, na próxima segunda-feira, promovido pela
Fundação Itaú Social, concedeu a seguinte entrevista ao site de VEJA:
Qual o contexto que permitiu a
criação da Academia de Liderança? Há
nove anos, Michael Bloomberg, prefeito de Nova York, e Joel Klein, chefe do
Departamento de Educação da cidade, perceberam que havia a necessidade de
líderes escolares apaixonados, dedicados e inovadores. Além disso, muitos
diretores estavam para se aposentar e não havia líderes disponíveis para essas
escolas. Foi quando a comunidade empresarial e as principais organizações
filantrópicas se uniram e contribuíram para o desenvolvimento da Academia de Liderança
de Nova York, com um investimento de 84 milhões de dólares.
Como se mantêm? Somos uma organização sem fins lucrativos que presta
serviço aos sistemas de ensino e recebe por isso. Também recebemos dinheiro de
algumas fundações e do governo.
Como é a seleção dos possíveis
diretores? O que procuram? Qualquer
pessoa que queira fazer parte do nosso processo seletivo precisa ter, no
mínimo, três anos de experiência com ensino. É o que estado exige. Há uma
rigorosa ficha de seleção a ser preenchida. Os aprovados são convocados para
uma dinâmica em grupo, na qual são colocados de frente a um problema e
questionados - como grupo - sobre como lidar com ele. Precisamos ter certeza de
que o candidato sabe escrever e se expressar bem, é um eficaz solucionador de problemas
e tem habilidade para lidar com as pessoas. Depois, os melhores são convidados
para uma entrevista individual, em que devem apresentar trabalhos acadêmicos, e
são questionados sobre questões pedagógicas. Temos um guia que orienta os
nossos processos seletivos e aponta o que precisamos considerar nos candidatos.
Os principais pontos são: comportamento pessoal, responsabilidade, resiliência,
liderança, capacidade de se comunicar, de resolver problemas e de supervisionar
os funcionários; cultura, gestão de tempo e tecnologia.
Como é o treinamento dado pela
academia? Oferecemos um programa de 18 meses,
dividido em três fases. A primeira expõe os participantes a rigorosas
simulações do que é ser um diretor; a segunda é uma fase de residência em que
ele fica em uma escola por 10 meses e convive duas vezes por semana com um
diretor para aprofundar seu conhecimento em campo. Por fim, a terceira etapa é
customizada para atender às necessidades da escola e do profissional para
efetuar a transição de poder.
Como uma boa liderança pode mudar a
realidade de uma escola? A liderança é
a alavanca que impulsiona a mudança em uma escola. O diretor define a melhoria
e alinha tempo, dinheiro e recursos para que seu objetivo seja atingido. Um
estudo do Instituto de Política Educacional e Social, da Universidade de Nova
York, mostra que os formados pela academia estão atuando em escolas que têm
mais desafios e ainda assim conseguiram que os alunos tivessem um aprendizado
mais acelerado em língua inglesa e matemática. Os diretores têm a oportunidade
de implementar sistemas de ensino com foco no aprendizado dos alunos, o que
inclui: selecionar professores altamente qualificados, desenvolver programas
curriculares de ensino e avaliação que se alinhem com as necessidades do estudante,
e dar suporte para as relações de colaboração entre os funcionários e entre
eles e os alunos.
Como os diretores devem colaborar com
os professores? O diretor deve guiar o professor na
tomada de decisões curriculares e de ensino. É fundamental que dê aos
profissionais a possiblidade de trabalharem juntos para resolverem os problemas
de aprendizagem dos alunos. Os professores devem avaliar juntos o que e como
estão ensinando, visitar uns aos outros nas salas de aula e trocar informações.
Um diretor eficaz é aquele que fornece ‘feedback’ aos professores e os orienta
sobre o seu trabalho e a melhor forma de melhorá-lo. É muito importante para o
líder gerir a escola bem e configurar os sistemas e estruturas que permitirão
que ela seja um lugar seguro e bem organizado, propício à aprendizagem.
É possível criar um bom líder ou
algumas pessoas simplesmente não têm as características necessárias? Nós, enquanto reconhecemos que algumas habilidades podem
ser desenvolvidas, também procuramos características específicas nos
candidatos. São elas: integridade profissional, compromisso de diminuir as
lacunas de aprendizado e trabalhar com estudantes de áreas mais vulneráveis,
conhecimento pedagógico, resiliência (capacidade para se recuperar de derrotas
e seguir em frente) e postura aberta ao aprendizado. Já as habilidades que
podem ser aprimoradas na academia são: supervisão pedagógica, comunicação,
resolução de problemas, análise de dados e planejamento estratégico.
Você acredita que é possível
implantar um sistema similar ao da cidade de Nova York em outros países, como o
Brasil? Os sistemas de ensino devem primeiro
reconhecer a importância da liderança, enxergá-la como uma forte alavanca para
impulsionar e melhorar o aprendizado dos estudantes. Depois, devem identificar,
treinar e dar suporte a estes líderes para que tenham condições de melhorar as
escolas em que atuam. Cada sistema de ensino é único e deve identificar seus
próprios padrões de liderança. Com isso, serão capazes de enfrentar o contexto
e as necessidades locais.
Fonte: Veja.com
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