quarta-feira, 6 de julho de 2011

A letra escarlate das escolas

A Letra Escarlate é um filme de Roland Joffé que conta a estória de Hester Prynne (Demi Moore), uma mulher que vive em 1666 e é submetida à humilhação de usar uma letra “A” vermelha marcada a ferro em sua carne. O efeito é devastador, fazendo-a sentir vergonha de si mesmo ao mostrar para todos o pecado que cometeu contra seu marido, o adultério.
Algo semelhante ocorre quando se trata da proposta da Câmara dos Deputados defendida por Gustavo Ioschpe (ZH, 4/6/2011). Ela é, de certa forma, a Letra Escarlate das Escolas. Ioschpe é muito qualificado, é verdade, mas qualificado em quê? Numa área denominada de Economia da Educação, que usa a econometria como ferramenta para medir de maneira quantitativa o impacto de diversas variáveis sobre aprendizagem.
Nada mais distante das ideias de autores como Henry Giroux, Rubem Alves e Marilena Chauí. Para estes autores, subjaz a discussão a definição da lógica de mercado como o portador da racionalidade sociopolítica e agente do bem-estar no interior da escola.
Neste campo situam-se todos aqueles que veem os direitos sociais apenas como mais um horizonte de serviços do Estado a serem definidos pela ideologia do mercado, outra forma de encolher o espaço público democrático dos direitos à Educação e ampliar nele o espaço do privado. É o caso de Ioschpe.
No outro campo estão os defensores da autonomia da escola que criticam o desejo de ver suas ações mediadas por termos como rendimento escolar e serem submetidos à coleta de indicadores de quantidade e não qualidade.
Eles reduzem a autonomia escolar pelo estabelecimento de metas baseadas em indicadores de desempenho e a gestão de receitas e despesas. Para os que pleiteiam anotar nas fachadas escolares o conceito do Ideb, a nossa Letra Escarlate, autonomia escolar é sinônimo de gerenciamento empresarial da escola. Nada mais perverso.
Marilena Chauí definiu o tipo de qualidade perseguida por este regime: aqui “qualidade”, competência e excelência existem sim, mas não no sentido a que aspiram professores e estudantes, mas no sentido daqueles pré-requisitos que atendem “às necessidades de modernização da economia”, numa palavra, as chamadas exigências da produtividade.
Para Chauí, ela é baseada em três critérios: quanto uma escola produz, em quanto tempo produz e qual o custo do que produz e, voilà, eis-nos diante do campo da econometria de Ioschpe que os educadores repudiam.
O problema é que se discute critérios da qualidade do trabalho escolar como se fossem os mesmos da produtividade capitalista – quantidade, tempo e custo – e não são. Os professores que questionam este modelo não são incompetentes como diz Ioschpe, apenas buscam qualidade e não quantidade em seu trabalho.
Jorge Barcellos, Fonte: Zero Hora (RS)

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