Quanto uma escola pode contribuir
para melhorar a capacidade intelectual de um estudante? Um estudo inédito
realizado por pesquisadores da Universidade de São Paulo (USP) com estudantes
assistidos pela ONG Ismart concluiu que o ambiente escolar contribui, e muito,
para alavancar alunos do nível básico ao avançado. Em dois anos, estudantes que
participaram de aulas no contraturno em colégios particulares avançaram mais de
100 pontos na média do Saresp, prova da rede estadual que avalia o desempenho
dos aluno.
O estudo foi feito entre 2005 e 2008
com cerca de 200 estudantes do 7º ano do ensino fundamental de escolas públicas
de São Paulo que se inscreveram para participar do Projeto Alicerce – programa
da ONG que concede bolsas em colégios particulares de elite que preparam o
aluno para cursar o ensino médio nessas instituições. Todos os alunos tiveram
desempenho semelhante no processo seletivo, com média próxima à nota de corte
(75%), porém metade foi aprovada e metade não.
A nota dos dois grupos era muito
parecida no Saresp, mas, dois anos depois, quando os estudantes concluíram o 9º
ano do ensino fundamental, a comparação do desempenho dos dois grupos apontou
diferenças. Os participantes do Projeto Alicerce avançaram 81 pontos e
obtiveram média de 353,668 na prova de português. Já os não aprovados
continuaram com um desempenho bom, 250,813, acima da média estadual (231),
porém estável. Em matemática, o quadro se repetiu: a média dos aprovados subiu
105 pontos, para 369,953 pontos, enquanto o dos reprovados avançou 30 pontos e
atingiu 277,225, também acima da média do Estado (245).
“Os resultados mostram que a escola
faz a diferença. Os alunos eram muito parecidos, em termos socioeconômicos e de
desempenho, mas, dois anos depois, a gente encontra um desempenho muito melhor
entre os participantes. Basicamente eles foram do nível adequado para o
avançado”, afirma o pesquisador Ricardo Madeira, responsável pelo estudo e
economista da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas da Universidade de São
Paulo (Fipe-USP).
Para Madeira, o aluno com bom
desempenho acaba sendo esquecido na escola pública, pois o foco das políticas
públicas é para o aluno de baixa proficiência, a grande maioria nas redes. “O
aluno talentoso acaba sendo ignorado, se sente desestimulado. O Estado precisa
reconhecer a heterogeneidade das turmas”, aponta.
Maria Amélia Sallum, diretora da Ismart, afirma que a ONG
assiste cerca de 700 estudantes, e 178 estão no Alicerce, estudando em escolas
de particulares de São Paulo, Sorocaba, Cotia, São José dos Campos e no Rio
Janeiro. “Temos dificuldade em preencher as 20 vagas disponíveis por escola
participante. É difícil encontrar alunos dentro do perfil. Tem que ter
motivação, família dando suporte, maturidade e bom desempenho. O programa exige
muito deles”, conta.
Cobrança
Rodrigo Honório de Lima, 17 anos,
ingressou no Projeto Alicerce em 2008 e hoje cursa o último ano do ensino médio
no Colégio Bandeirantes, um dos mais tradicionais de São Paulo, cuja
mensalidade custa mais de R$ 2 mil. Para ele, além da infraestrutura, uma das
principais diferenças entre a particular e a escola estadual Rodrigues Alves,
onde estudava na avenida Paulista, era a cobrança dos alunos. “Senti que eu
precisava me organizar, ter uma rotina de estudos, sabia que se não estudasse
ia refletir na nota. Na pública tinha falta de professores, às vezes não tinha
prova, era só trabalhinho da lousa”, conta.
O estudante, que se forma neste ano e pretende estudar
Economia na USP, FGV ou Insper, conta que a adaptação ao colégio particular foi
mais fácil do que o esperado. “Imaginei uma coisa e de fato foi outra. Achei
que teria preconceito, discriminação, mas nunca teve isso. Nunca fui segregado
por nada. Há um respeito muito grande. Se me perguntam se sou bolsista, digo
que sim, com muito orgulho. E as pessoas me dão parabéns”, conta Rodrigo, que
vive com a mãe nos fundos de uma clínica odontológica, onde ela trabalha como
caseira.
Outra perspectiva
Também ex-aluno do Projeto Alicerce,
Nicolas Rodrigues, de 19 anos, é hoje aluno da Faculdade de Medicina da Santa
Casa de São Paulo. Em 2006, iniciou a 7ª série do ensino fundamental no colégio
Santo Américo, junto com a Escola Estadual Dib Audi, e concluiu o ensino médio
na escola particular. “Na particular eu tinha aulas de laboratório, coisa que
no colégio público não tinha. Os alunos eram mais estimulados e as aulas eram
muito produtivas. Na escola pública nem todo mundo estava no espírito de se
dedicar”, lembra.
Ele destaca que teve bons professores
na escola estadual, mas que teria sido muito mais difícil fazer Medicina sem
uma bolsa em uma escola particular. “Fazer uma grande faculdade era algo
inimaginável. Meu pai era metalúrgico e queria me colocar num colégio técnico,
para conseguir um emprego. Esta era a melhor perspectiva que eu tinha”, conta.
Filho de migrantes nordestinos que
não completaram o ensino fundamental, Nicolas é motivo de orgulho para a
família. “Às vezes meu pai sai pra trabalhar com uma camiseta minha da faculdade
só para contar para os amigos que o filho faz Medicina.” Bolsista do Prouni,
ele ainda conta com uma bolsa de estudos da Ismart equivalente a 10 salários
mínimos por ano, para gastos com material didático, livros e transporte.
Fonte: iG
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