As escolas públicas brasileiras,
principalmente nos níveis fundamental e médio, estão perdendo espaço para os
colégios particulares. Nos últimos dez anos, a Educação básica municipal,
estadual e federal, perdeu um total de 4,834 milhões de estudantes, enquanto o
ensino privado ganhou 1,090 milhão de matrículas.
De acordo com levantamento feito pelo
Valor, na média calculada de 2002 a 2011 o setor público perdeu 480 mil
matrículas por ano e o mercado educacional privado arrebanhou cerca de 110 mil
novos alunos anualmente. Especialistas em Educação arriscam várias hipóteses
para explicar o ocorrido.
Uma das análises mais plausíveis é o
crescimento econômico do país associado ao aumento da renda, o que estimula
famílias que ascenderam socialmente a tirar seus filhos da escola pública e
colocá-los na particular.
Para Priscila Cruz,
diretora-executiva do Movimento Todos Pela Educação, a nova classe média
brasileira cria um movimento de migração na Educação. "É uma nova
fronteira de classe. Há um consumo maior, a família compra um carro, passa a
comer mais fora. Depois disso passa a aspirar mais coisas, como o ensino particular.
Ela se dá conta que Educação é importante para a manutenção na classe média e
até para subir de classe", avalia.
Em dez anos, os maiores movimentos de
aumento de matrículas nas escolas particulares e de perda exponencial de alunos
nas públicas coincidem com os anos em que a economia brasileira mais cresceu. O
Produto Interno Bruto (PIB) avançou acima de 6% de 2007 para 2008, período em
que os colégios privados matricularam 700 mil alunos e os públicos perderam
cerca de 500 mil. Em 2010, quando o PIB cresceu 7,5%, a maior alta em 24 anos,
o país registrou 400 mil novas matrículas no ensino privado e quase 1 milhão de
baixas nas escolas públicas.
O economista Naercio Menezes Filho,
coordenador da área de políticas públicas do Instituto de Ensino e Pesquisa (Insper),
afirma que os números refletem "uma lógica natural": "O fato é
que se a família tem ganho de renda prefere matricular o filho na escola
privada. É a preferência revelada, escolhe porque acha melhor."
Embora a mais recente Pesquisa de
Orçamento Familiar (POF) do IBGE, referente a 2008 e 2009, aponte redução da
participação dos gastos com Educação nas despesas mensais médias das famílias
brasileiras, Menezes Filho pondera que é preciso isolar algumas variáveis para
verificar exatamente os aumentos por grupos de despesas. "A família que
gasta zero com Educação interefere na média final, sem falar que a média é
composta por outras variáveis. Se uma família gasta mais com alimentação e
transporte do que com Educação, isso acaba concorrendo com as despesas de
ensino na média."
Além do fator econômico, a questão
demográfica explica parte da perda de matrículas - em 2002, estavam
matriculados 54,7 milhões de alunos até o ensino médio, número que caiu para
50,9 milhões em 2011, considerando escolas públicas e privadas. O IBGE projeta
queda de 20% da população de 6 a 14 anos até 2022. Outro fator que explica a
perda de matrículas no setor público é a correção do fluxo escolar, com menos
crianças na escola com distorção de idade, informa o Ministério da Educação
(MEC), no documento "Resumo Técnico do Censo Escolar da Educação Básica
2011", divulgado nesta semana.
Por outro lado, a percepção de que a
qualidade do ensino público não vai bem pode influenciar migrações. Mas essa
percepção pode ser um mito, diz Priscila. "É importante sinalizar que boa
parte dos colégios privados tem resultado de escola pública. O que vemos é um
novo mercado crescendo e é importante o governo ficar de olho, afinar a
regulação."
O economista Ernesto Martins Faria, coordenador de projetos
da Fundação Lemann, pondera que seria importante conhecer a realidade
socioeconômica dos alunos antes de tirar qualquer conclusão. "As pessoas
das classes C e D provavelmente estão indo para escolas privadas não tão boas.
Mas, sem dúvida, esse aumento reflete uma maior importância da pauta Educação
no Brasil."
No "Resumo Técnico do Censo
Escolar da Educação Básica 2011", divulgado nesta semana, o Ministério da
Educação (MEC) admite que é preciso corrigir o fluxo de alunos do ensino
fundamental e que o nível médio no país deveria ter mais 2 milhões de alunos
para chegar "a uma situação de equilíbrio" nas matrículas. O
documento mostra que, nos últimos cinco anos, o número de alunos do ciclo ficou
estável em torno de 8,4 milhões.
"O aluno potencial do ensino
médio é o concluinte do ensino fundamental. A estimativa é que a situação de
equilíbrio da matrícula seja em torno de 10,4 milhões, que corresponde à
população na faixa etária de 15 a 17 anos." O ensino médio é uma das
modalidades mais problemáticas da Educação básica brasileira, com baixa taxa de
conclusão, de 50%.
Por outro lado, o médio profissional
tem registrado crescimento das matrículas. Em 2011, foi o ciclo educacional que
mais cresceu, com 993.187 matrículas, uma alta de 7,5% sobre 2010.
Fonte: Valor Econômico (SP)
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